Sermão nº 3123
ministrado por C. H. Spurgeon em 06 de dezembro de 1874, na noite de domingo, no Tabernáculo Metropolitano de Londres, e publicado em 17 de dezembro de 1908
Pilatos escreveu também um título e o colocou no cimo da cruz; o que estava escrito era: JESUS NAZARENO, O REI DOS JUDEUS. (João 19.19)
Na época de Jesus, quando um homem era condenado à morte por crucificação, era costume dos romanos afixar na cruz, em algum lugar visível, uma placa com a descrição do seu crime. Ali eram colocados seu nome e qualificação, bem como a acusação feita contra ele, a fim de que todos os que passassem pelo local pudessem ler a razão pela qual estava sendo submetido a uma morte tão desonrosa. Nosso Salvador, portanto, ao ser contado com os malfeitores, devia ter o mesmo tratamento. Se a acusação deles foi publicada, a Dele também deveria ser publicada entre os filhos dos homens. Como foi admirável a condescendência dAquele que os céus adoravam como o bendito Filho do Altíssimo em ser pendurado no madeiro e ter Sua acusação escrita acima da Sua cabeça, como se fosse um malfeitor qualquer!
Gostaria que percebêssemos tanto a dignidade da pessoa de Cristo, quanto a vergonha à qual Ele foi exposto. Se tivéssemos essa percepção, nosso coração se encheria de pesar e de gratidão a Ele por condescender em morrer a morte de cruz. Queria que nos fosse possível, por um instante, estar ao pé da cruz com Maria, João e os outros discípulos, ouvindo toda zombaria e escárnio, e, então, elevar os olhos e ver aquela face triste, aquele corpo torturado e ler, em hebraico, grego e latim: “Jesus de Nazaré, o Rei dos Judeus”. É incrível que Pilatos tenha escrito, como registrado por Mateus e Lucas: “Este é o Rei dos Judeus”, e nem sequer fiquemos admirados pelo fato dos principais sacerdotes terem dito a ele: “Não escrevas: Rei dos judeus, e sim que ele disse: Sou o rei dos judeus.” (Jo. 19.21), e Pilatos tenha respondido: “O que escrevi, escrevi.” (Jo 19.22).
É interessante como a divina Providência sempre dá um jeito. Não importa quem sejam as pessoas envolvidas, Deus sabe como fazer prevalecer a Sua vontade. Era Seu propósito que Seu Filho não morresse na cruz sem uma proclamação pública da Sua inocência e um reconhecimento oficial de que Ele era quem dizia ser, ou seja, o Rei dos Judeus. E, quem poderia colocar tal inscrição acima da Sua cabeça enquanto Ele estava pendurado lá? Bem que Pedro poderia ter tentado alguma barganha para fazê-lo, mas, com certeza, não teria conseguido, pois os soldados romanos vigiavam atentamente cada centímetro do local da execução. Mesmo João, por mais ousado que fosse naquele momento de crise, não teria conseguido. O ideal era que fosse feito por uma autoridade, por um governador romano, com pena oficial, para que nenhum sumo sacerdote invejoso ousasse derrubá-la, e nenhum escarnecedor se erguesse para apagar seu testemunho. Aquela inscrição era privilegiada, pois foi escrita pela pena de um oficial romano, e ali devia ficar, sob a autoridade da lei romana, enquanto o corpo de Jesus permanecesse pendurado na cruz. Veja como Deus faz as coisas. Ele fez o hesitante Pilatos se tornar obstinado e fê-lo resolver fazer aquilo que todos pensavam que seria a última coisa que ele faria. Embora, provavelmente, fosse sua intenção ridicularizar o Salvador, tudo foi feito como Deus queria que fosse, e Jesus, pendurado na cruz, foi proclamado pela autoridade romana como “o Rei dos Judeus”.
À primeira vista, talvez isso pareça um fato sem importância, mas creio que posso lhes mostrar que não é, se vocês se sentarem agora ao pé da cruz, olharem para o Senhor crucificado e lerem novamente a inscrição. Peço que a leiam sob duas perspectivas diferentes. A primeira, com relação ao homem, e a segunda, com relação ao próprio Jesus Cristo.
I Em primeiro lugar, veja a proclamação de Pilatos COM RELAÇÃO AO HOMEM.
Este é um retrato de como o mundo rejeita o Salvador. O Salvador realmente veio ao mundo. Para ser conhecido como um Salvador, Ele teve de receber o nome de Jesus, ou seja, Salvador. Para ser conhecido como um homem extremamente manso e humilde, Ele teve de condescender em viver entre o tipo mais humilde de pessoas, ou seja, teve de escolher viver em Nazaré e ser chamado de Nazareno. Assim, Ele foi conhecido como Jesus, o Salvador, e Jesus de Nazaré, um Salvador acessível e humilde. Jesus veio ao mundo para salvar os homens; e Ele iniciou Sua missão salvando muitas pessoas de doenças consideradas incuráveis. Ele abriu os olhos aos cegos, desimpediu os ouvidos aos surdos, fez os mudos falarem, purificou leprosos e até ressuscitou mortos. Também houve muitos a quem Ele curou de enfermidades espirituais, pois deu fé aos que não tinham fé e santidade e caráter excelente àqueles que, até então, viviam em pecado.
Ele era, de fato, Jesus, o Salvador, mas como os homens O receberam? Será que eles se achegaram a Ele e caíram a Seus pés, beijando o próprio chão em que Ele pisava? Não seria surpresa se o fizessem, mas eles não o fizeram. Será que todos os doentes O rodearam alegremente, ansiosos por tocar a orla de Suas vestes e serem curados? Alguns poucos sim; “um remanescente segundo a eleição da graça” (Rm 11.5), e àqueles que O receberam, Ele “deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus, a saber, aos que creem no seu nome” (Jo 1.12). Contudo, não foi assim com a grande multidão, que via nEle algo estranho e singular, e não inimizade, furor, orgulho ou amargura, somente um grande amor. Apesar disso, eles tinham de tratá-lo da forma mais vil, pois Sua vida foi passada em pobreza e reprovação, e, finalmente, Ele foi condenado à morte na cruz maldita. O mundo O crucificou como criminoso e, ao fazê-lo, os homens disseram: “Este é o Salvador, o Nazareno, e é assim que nós O tratamos. Não queremos ser salvos do pecado, pois nós o amamos. Não queremos ser salvos da rebelião e ser reconciliados com Deus por meio de Jesus Cristo. Assim, isso é o que fazemos com o Embaixador de Deus. É assim que servimos Aquele que vem com palavras de reconciliação e graça nos lábios. Nós O penduramos para morrer, pois não O queremos”. Isto é apenas uma mostra daquilo que os corações pecaminosos fazem. Até serem transformados pela graça, eles não terão o Salvador para governá-los.
No entanto, alguém diz: “Sua acusação contra mim é muito cruel!” Será mesmo? Você já recebeu Jesus? Você crê nele? Ele já se tornou seu Salvador? Se não, por que não? Você pode me dar uma boa razão para não crer nele e rejeitá-lo? A mim me parece que, e deixo isso por conta da sua consciência, ao continuar descrente, você praticamente está dizendo: “Prefiro ser condenado para sempre a crer em Jesus Cristo.” De qualquer forma, essa é sua escolha neste momento; e, se alguém demonstra tal objeção a Cristo a ponto de desejar ser lançado no inferno antes de Jesus poder salvá-lo, podemos acreditar que em seu coração haja suficiente inimizade contra Cristo para crucificá-lo novamente se Ele estivesse aqui outra vez. Cristo seria crucificado amanhã mesmo, se viesse entre corações não regenerados; sim, pelas mesmas pessoas que andam com crucifixos de marfim pendurados no pescoço, que os guardam em seus livros de oração e os penduram em suas paredes. Eles gritariam, da mesma forma que seus antepassados: “Fora! Fora! Crucifica-o!” Até hoje, quando se prega a morte substitutiva, o sangue propiciatório e a salvação somente pela fé em Jesus Cristo, não por meio de “sacramentos”, sacerdotes e boas obras, as pessoas ficam com raiva, pois ainda odeiam o Cristo, o único Salvador dos filhos dos homens.
Vejo também que o homem mata o Deus encarnado: “Jesus de Nazaré, o Rei dos Judeus”. Quer Pilatos tivesse ou não a intenção de dizer que Jesus era o Messias, os judeus viram que esse seria o significado atribuído à inscrição acima da cabeça de Cristo; seria dito que seu Messias tinha sido crucificado; consequentemente, eles queriam que a inscrição fosse alterada, mas Pilatos não iria alterá-la. Ora, o Messias dos judeus não era outro senão Deus em carne humana. Isaías não falou dele como Emanuel, o Deus conosco? Ele era o prometido “descendente da mulher”, que devia esmagar a cabeça da antiga serpente. Foi dele que Davi disse: “Disse o Senhor ao meu senhor: Assenta-te à minha direita, até que eu ponha os teus inimigos debaixo dos teus pés.” (Salmo 110.1). Ele era o Filho de Davi, e também o Senhor de Davi; e lá está Ele: Ele veio aos homens e, como Deus, veio para tabernacular em carne humana e habitar entre os homens.
A história nos conta como Ele foi encontrado ainda bebê numa manjedoura de Belém, onde os pastores foram adorá-lO; como Ele cresceu entre os homens como qualquer outro homem, trabalhando na carpintaria de Seu pai adotivo; e como, durante todo o tempo, Ele foi o Deus oculto sob a humilde forma do Filho de Maria. Mesmo quando chegou o tempo da Sua manifestação a Israel, Ele ainda estava oculto, embora Sua divindade por vezes brilhasse através do véu da Sua humanidade. Ele ordenou ao mar que se aquietasse, quando suas ondas ameaçaram engolir o navio em que Ele estava com Seus discípulos. Ele operou maravilhas tais que era evidente que todas as coisas Lhe obedeciam. Cardumes vieram das profundezas para a rede que Ele havia ordenado a Seus discípulos lançar ao mar; pães e peixes foram multiplicados em Suas mãos, e nas dos discípulos, pelo Seu poder milagroso. As pessoas não podiam deixar de ver que Ele era muito mais que um homem comum, e que, de fato, era o Filho de Deus, como afirmava ser. Contudo, os lavradores, a quem Ele foi enviado pelo Pai para receber a sua parte no aluguel da vinha que fora arrendada a eles, disseram: “Este é o herdeiro; ora, vamos, matemo-lo e apoderemo-nos da sua herança.” (Mateus 21.38). Em outras palavras, eles disseram: “Este é Deus-Homem, vamos fazer com Ele o que faríamos com Deus, se pudéssemos.” Então, eles O crucificaram como criminoso e colocaram uma inscrição acima da Sua cabeça, como se dissessem ao próprio Deus: “Isto é o que fazemos Àquele que era mais semelhante a Ti do que qualquer homem de que já ouvimos falar, Àquele que diz que Ele e Tu são um”.
Senhores, este mundo nunca foi tão perverso quanto foi demonstrado naquela ocasião. A essência de todo pecado é a inimizade contra Deus e, quando qualquer pecado é analisado, o que sempre se encontra no seu interior é: “Sem Deus”. O pecado é uma punhalada no coração de Deus. Cada vez que pecamos, é como se disséssemos: “Não queremos a autoridade de Deus; não queremos Suas leis; não queremos Deus.” Certa vez, ouvi um eloquente teólogo, que apontava os grandes pecados da humanidade, terminar sua acusação com uma notável expressão: “este mundo deicida”. Com isso, ele chegou ao clímax da verdade, pois este é um mundo deicida. Na verdade, o mundo não pode matar a Deus; mas, se pudesse, ele o faria. E, ao levar Cristo à morte, o mundo mostrou a inimizade contra Deus que estava em seu coração. O mundo não mataria o seu próprio deus, o deus que as pessoas imaginam; o deus produzido pelo seu próprio intelecto, o deus que é como eles mesmos, de quem lhes falei esta manhã. No entanto, quanto ao Deus da Bíblia, existem milhões de pessoas que, se pudessem, O expulsariam alegremente do seu universo. Mas ainda assim, Ele é Yahweh, o único e verdadeiro Deus.
Observo, ainda, que a principal objeção do homem a Cristo é Sua autoridade, pois o cerne daquela inscrição era “Jesus, o Rei”. Pilatos não escreveu: “Este é Jesus, o Mestre”, ou muitos teriam dito: “Deixem que Ele ensine o que quiser, isso não interessa. Não nos importamos com o que os videntes veem, ou com o que dizem.” Pilatos também não colocou: “Este é Jesus, o Sacerdote”. Muitos teriam ficado contentes em deixá-lO ser o grande Sumo-Sacerdote se eles também pudessem ser sacerdotes. Mas Pilatos escreveu: “Este é Jesus, o Rei”, e esse era o alvo contra o qual eles atiravam todas as flechas. Lembram-se do que diz o escritor do Salmo 2? “Os reis da terra se levantam, e os príncipes conspiram contra o Senhor e contra o seu Ungido, dizendo: Rompamos os seus laços e sacudamos de nós as suas algemas.” A determinação da natureza humana, até que esta seja renovada, é sempre a mesma: “Não queremos que este reine sobre nós.” (Lucas 19.14). As pessoas podem até querer que Cristo as salve, mas não que Ele reine sobre elas. O homem gosta de leis como: “Amarás o teu próximo como a ti mesmo.” (Mt 22.39), “Perdoarás até setenta vezes sete.” (Mt 18.22), ou seja, leis que falam de amor, bondade e benevolência; mas, quando essas leis se voltam contra ele e refreiam sua ambição, reprimem sua cobiça e condenam sua justiça própria, imediatamente ele se ofende. E, quando Cristo diz: “Passará o céu e a terra, porém as minhas palavras não passarão.” (Mt 24.35), quando Ele começa a ensinar sobre a necessidade de pureza absoluta e a dizer que até mesmo um olhar lascivo é pecado, então as pessoas respondem: “Suas regras não servem para nós”, e O condenam à morte porque não querem se submeter à Sua autoridade.
Mais uma vez aprendemos com essa narrativa que os homens ridicularizam o reino de Cristo. Pilatos não odiava a Cristo; provavelmente nem pensava nele o suficiente para hostilizá-lo. Não tenho dúvidas de que ele via Jesus como um pobre coitado que viveu tanto tempo sozinho que acabou ficando de miolo mole. Jesus era bem-intencionado, e até inteligente, mas, ainda assim, não era o tipo de pessoa com quem um governador romano devesse discutir. Pilatos ficou muito triste por ter de condená-lo à morte, pois havia muita coisa boa naquela criatura para ele deixar que Seus inimigos O destruíssem. Quando surgiu a pergunta sobre o reino de Cristo, nem posso imaginar o quanto Pilatos foi sarcástico ao Lhe perguntar: “És tu o rei dos judeus?”. Quanto desdém ele deve ter sentido ao olhar para aquela pobre criatura emaciada, que parecia ser desprezada por todos, quando Cristo lhe respondeu: “O meu reino não é deste mundo.”, e Pilatos Lhe perguntou, em tom de zombaria: “Logo, tu és rei?”. Pilatos deve ter sentido que podia escarnecer dEle, e não tenho dúvida de que foi nesse espírito que ele escreveu: “Este é Jesus, o Rei dos Judeus”, um tipo de humor sarcástico sombrio, primeiro, em relação aos judeus, depois, em relação ao próprio Cristo, pois era o mesmo que dizer: “Este é o grande Rei esperado pelos judeus. Eles vão lutar contra César e conseguir a liberdade, e este é o líder que vai ajudá-los a derrotar as legiões do glorioso Império Romano.”
Para os ímpios da nossa época, a ideia de um reino espiritual é totalmente incompreensível; eles não conseguem imaginar o que seja isso. A relação entre igreja e Estado não pode ser determinada por estadistas de qualquer partido político. Essa relação é muito singular, mas estado e igreja são tão diferentes quanto matéria e espírito. Apesar de ambos os reinos frequentemente se sobreporem, não é possível traçar uma linha e dizer: “até aqui vai o Estado e até aqui vai a Igreja”. O fato é que a verdadeira igreja de Cristo jamais será subordinada ao Estado; sua esfera de ação é completamente diferente e seu governo é inteiramente distinto. Para algumas pessoas, um reino espiritual significa leis e regulamentos estabelecidos por bispos, sínodos e concílios, mas esse tipo de reino não é mais espiritual do que um decreto aprovado pela Câmara dos Comuns e pela Câmara dos Lordes. Este é apenas outro reino da carne, um estado eclesiástico semelhante ao estado secular. O reino espiritual de Cristo, no entanto, não é algo que se possa ver com os olhos ou entender com a mente humana; para se entrar nele, ou até mesmo para vê-lo, “é preciso nascer de novo”. Ele é sublime demais para ser controlado pela legislação dos homens. É um poder tremendo que Cristo estabeleceu neste mundo, um poder mais forte que todos os estados seculares combinados; um reino como a pedra cortada do monte sem o auxílio de mãos (Daniel 2.44-45), que esmiuçará todos os outros poderes e encherá toda a terra no tempo designado por Deus. Oh, que pudéssemos ver mais manifestações do seu poder no coração dos nossos contemporâneos. O poder do reino em que Cristo é Rei, este bendito livro é a lei, o Espírito Santo é o grande executivo e cada um de nós é um servo nas cortes do grande Rei, vivendo e agindo segundo a Sua vontade.
“Mas”, você diz, “isso é simplesmente ridículo!”. Sim, achei que diria isso; isso é o que o mundo sempre diz a respeito do reino de Cristo, que ele é ridículo. As pessoas podem entender um reino no qual há um líder como o Papa, onde existem cardeais, bispos e sacerdotes. Elas podem entender o Arcebispo de Cantuária ou o Arcebispo de York, e tudo o que está relacionado ao Episcopalismo; mas saber que somos um com Cristo, que Ele nos fez reino e sacerdotes para Deus e Seu Pai, que os santos vão reinar com Ele para todo o sempre, e que “as armas da nossa milícia não são carnais, e sim poderosas em Deus, para destruir fortalezas” (2Co 10.4), elas não entendem, e nem querem entender. E é por isso que elas ainda crucificam a Cristo, o Rei, e dizem: “Se esse é o Seu reino, não queremos pertencer a ele, nem acreditamos nele. Chega, esse reino não é digno da nossa consideração, só gente vulgar fará parte de um reino como esse.” Foi assim no início e é assim agora, mas não “será para sempre, por toda a eternidade”, pois o Rei está vindo, pela segunda vez, em todo o esplendor da Sua glória, e fará com que todos saibam que, embora Seu reino não seja como os demais, e não seja mantido por ouro, pompa, posição, dignidade e força física, é um reino que subsistirá a todos os príncipes e tronos da terra, onde todos os que pertencem a ele terão uma coroa e serão cheios de glória, diante do que toda a pompa deste mundo perderá seu valor para sempre.
II. Agora, em segundo lugar, tenho que pedir sua atenção para o assunto de uma forma totalmente diferente, ou seja, COM RELAÇÃO A CRISTO. Qual o significado daquela inscrição acima da Sua cabeça?
Primeiramente, o significado era que a honra de Cristo era evidente. Olhe para a inscrição acima do ladrão crucificado ao lado de Jesus. “Condenado à morte por roubo nas montanhas, onde foi pego em flagrante, tendo esfaqueado um dos guardas que tentava prendê-lo.” A inscrição é clara. Agora, passe para a inscrição acima da cabeça de Jesus, para saber qual foi o Seu crime; com certeza, devem ter escrito a pior coisa que Ele fez. Ali estão os principais sacerdotes e escribas, e uma multidão de judeus, tentando ver o que está escrito, e eis Pilatos querendo desculpar sua própria consciência. Se ele puder escrever algo que o isente da culpa pela morte de Jesus, com certeza ele escreverá. Então, ele pega sua pena e escreve: “Este é Jesus de Nazaré, o Rei dos Judeus”. E aí você diz: “Ora, será que é só isso que eles podiam dizer contra Jesus, que Ele era Jesus de Nazaré, o rei dos Judeus?”. Sim, essa era a Sua única ofensa; Sua culpa não poderia ser resumida em outras palavras. Seu crime era ser o que Ele é, um Salvador que morava em Nazaré, e que Ele era o Rei dos Judeus. Ora, nada poderia ser melhor para isentar de culpa o Seu caráter do que esta acusação oficial. E, se a acusação não tem nada a dizer contra Ele, imagine o quanto Seus amigos têm a dizer a Seu favor! Quando alguém é levado perante um juiz, seu acusador faz o possível para dizer tudo o que pode contra ele e, quando Cristo estava prestes a ser morto, os responsáveis por aquele crime hediondo fizeram a pior acusação possível contra Ele. No entanto, isso era tudo o que eles podiam fazer, não havia outra acusação, exceto a de que Ele era Jesus de Nazaré, o Rei dos Judeus. Veja, então, como o Cordeiro da nossa páscoa era absolutamente sem defeito e sem mancha. Veja como Ele “não conheceu pecado”, embora tenha sido feito oferta pelo pecado “para que, nele, fôssemos feitos justiça de Deus.” (2Co 5.21). Exultem, cristãos, neste testemunho público e oficial da pureza imaculada de toda a Sua vida e caráter.
A seguir, no que diz respeito a Cristo, podemos ver essa inscrição como a explicação da sua morte, bem como do Seu caráter imaculado. Mantenha a inscrição claramente em sua mente: “Jesus de Nazaré, o Rei dos Judeus”. Esta é a razão pela qual Ele morreu. Jesus morreu, primeiro porque Ele era Jesus, porque era o Salvador. Esse é o verdadeiro significado, não que simplesmente fosse um exemplo, não que somente desse testemunho da verdade, mas aquela morte cruel significava expiação, e salvação por expiação. Olhemos para Ele na cruz. Se já fizemos isso antes, olhemos novamente e digamos: “Sim, bendito Salvador, vemos que Tu morreste, que Tu morreste para nos salvar; e nós Te engrandecemos porque esta foi a causa da Tua morte, que eras o Salvador.” O título dado por Pilatos significava que Cristo era o Messias, e que Ele morreu por ser o Messias. “Será cortado o Messias, mas não para si mesmo” (Dn 9.26, ACF). Esta é a maravilhosa linguagem do profeta Daniel, “cortado, mas não para si mesmo”, cortado porque era o Enviado de Deus, o Ungido do Altíssimo. O profeta Zacarias também registrou as palavras de Yahweh: “Desperta, ó espada, contra o meu pastor e contra o homem que é o meu companheiro, diz o Senhor dos Exércitos” (Zc 13.7). Naquela inscrição, amado, você tem a razão para a morte de Cristo condensada em uma única frase. Jesus morre porque é o Salvador, o Messias ungido e profetizado, enviado por Deus para ser o Rei dos Judeus, e também dos gentios.
Ainda com relação a Cristo, a inscrição sobre a Sua cabeça foi uma reivindicação feita e proclamada naquele exato momento. Ele está pendurado na cruz, não há arauto para proclamar Sua realeza; mas Ele não precisa de arauto, pois os mesmos soldados que prendem Suas mãos no madeiro, colocam acima dele uma inscrição que não poderia ser melhor, pois é escrita em três línguas diferentes, para que toda humanidade possa ler: “Este é Jesus, o Rei dos Judeus”. Ele afirma ser Rei, por isso peço-lhe que fique ao pé da cruz e aceite Sua reivindicação. Se você quer que Jesus seja seu Salvador, você precisa aceitá-lo também como Rei; precisa se submeter ao Seu governo, pois Ele reivindica o direito de governar sobre todos os que O reconhecem como Jesus; sim, e ainda mais, Ele reivindica o direito de governar sobre toda a humanidade, pois todo poder é dado a Ele tanto no céu como na terra, e somos ordenados a proclamar o Seu reino por todo o mundo, e a dizer a todos os homens: Jesus de Nazaré é Rei, prostrem-se diante Dele. Sim, reis, prostrem-se diante Dele, pois Ele é o Reis dos reis; sim, nobres e senhores, prostrem-se diante Dele, pois Ele é o Senhor dos senhores; e todos os filhos e filhas dos homens, prostrem-se a Seus pés, pois Ele reina; e, mesmo que você seja Seu inimigo, Ele reina sobre você também; a despeito de toda sua inimizade e oposição, você deve prostrar-se a Seus pés. As reivindicações de Jesus, portanto, foram proclamadas até mesmo na cruz onde Ele morreu; por isso, não resistam, entreguem-se voluntariamente a Jesus agora, e deixem que Ele reine sobre vocês agora e para sempre.
E, assim, com a fixação daquele título, não apenas a reivindicação da Sua soberania foi imediata, mas a proclamação do Seu reino também. Em uma monarquia terrena, tão logo um rei deixe o trono, é comum que seu sucessor seja proclamado; e, pela acusação escrita acima da cabeça de Cristo, foi proclamado em toda a terra que Jesus assumira o trono, e também que Ele nunca deixou de reinar. Ele foi para o Pai, voltou à terra, onde ficou por quarenta dias e, então, Seus pés deixaram o monte das Oliveiras e Ele ascendeu ao trono, onde está assentado “aguardando, daí em diante, até que os seus inimigos sejam postos por estrado dos seus pés” (Hb 10.13). Seu reino já está estabelecido. Você pertence a ele? É um reino que, em certo sentido, foi reconhecido na cruz pela proclamação de Pilatos, embora já existisse há muito tempo, por ser um reino eterno. Você pertence a ele, ou está do lado de fora, contra ou indiferente a ele? Lembre-se de que quem não é por Cristo é contra Ele. Ele considera que quem não está a Seu lado está do outro lado. Irmãos, vocês estão no reino do Senhor Jesus Cristo? Se estiverem, sei que olham com deleite para aquela inscrição; e, quando confiam na purificação efetuada pelo sangue de Cristo, elevam os olhos para aquela cabeça querida, coroada de espinhos, e se alegram em pensar que Jesus de Nazaré, o Rei dos Judeus, é também seu Rei, Senhor e Salvador.
Quero fazer só mais uma observação sobre essa inscrição. Uma vez que Pilatos não quis alterá-la, parece-me que Deus mostrou à humanidade que ela jamais seria alterada. Pilatos poderia muito bem ter mandado alguém pegar a inscrição e, com apenas alguns traços da sua pena, ter inserido as palavras que o sumo sacerdote tanto queria: “Ele disse, eu sou o Rei dos Judeus”. Mas ele não quis fazer isso; e o sumo sacerdote não podia fazer, e nem o diabo ou todos os demônios do inferno e até mesmo os homens mais perversos da terra, com toda a sua ira, ainda não podem fazê-lo. Da mesma forma que Pilatos, Deus disse: “O que escrevi, escrevi.” “Eu, porém, constituí o meu Rei sobre o meu santo monte Sião.” (Sl 2.6). Ele deve reinar e nenhum poder jamais poderá tirar Dele o Seu reino! Sua Igreja ainda ora: “Venha o Teu reino”, e esse reino virá em toda a sua plenitude quando todo Israel for reunido e aceitá-lo como seu Senhor e Rei. Sim, e mais ainda, pois “Ele também dominará de mar a mar e desde o rio até aos confins da terra. Curvem-se diante dele os habitantes do deserto, e os seus inimigos lambam o pó. E todos os reis se prostrem perante ele; todas as nações o sirvam.” (Sl 72.8-9, 11).
Caros amigos, esta é a conclusão da questão: aceitemos alegremente Jesus como nosso Rei. Já fizemos isso? Então, tentemos levar Suas conquistas ainda mais longe e procuremos alargar as fronteiras do Seu reino. Já fazem isso? Então, façam-no com mais empenho, e com o instrumento certo, pois a grande arma da conquista é a cruz. Foi na cruz que a proclamação foi levantada pela primeira vez e é pela cruz que ela deve ser levada até os confins da terra; não pela eloquência ou erudição humana, não pelo suborno ou ajuda do Estado e nem sei mais o que, mas pela apresentação clara do Cristo crucificado entre os filhos dos homens. A cruz é o seu próprio martelo e arma de guerra (Jr 51.20). “Com este sinal vencerás” (1). Que a igreja pregue mais a Cristo e viva mais de Cristo, e então a proclamação do Seu reino, que foi primeiramente fixada naquela cruz, será exaltada em todo o mundo, e o poder do Seu reino será sentido até nos confins da terra.
Olhei na escuridão e pensei ter visto diante de mim uma cruz, e vi Aquele que uma vez foi pendurado nela; mas, enquanto eu olhava, aquela cruz parecia crescer. Ela parecia transformar-se em uma árvore, e vi suas raízes aprofundando-se cada vez mais, até tocarem e abençoarem as profundezas da miséria humana. Então eu a vi subir nas alturas, perfurar as nuvens e passar pelo firmamento acima das estrelas; ela erguia sobre si os crentes e, com seu poder majestoso, levava-os ao próprio trono de Deus. Depois, eu a vi estender seus poderosos galhos para todos os lados. Sua sombra caía sobre as terras da nossa pátria e também sobre as terras do outro lado do mar. Enquanto eu observava, os benditos galhos se estendiam por toda Europa, Ásia, África, América e Australásia também. Eu a vi crescer até se tornar tão grande que sua sombra parecia encobrir toda a terra, e eu bendisse e adorei o Deus do céu que havia instituído um poder tão grande para bênção dos filhos dos homens. Ó, Jesus, um dia crucificado, mas agora exaltado, que assim seja, que sejamos Teus humildes instrumentos na propagação do Teu reino bendito; e para sempre Te adoraremos, como o fazemos agora, não apenas como “Jesus de Nazaré, o Rei dos Judeus”, mas como o bendito e único Soberano, o Rei dos reis e Senhor dos senhores; a quem seja honra e poder eterno. Amém! (1Tm 6.15-16)
Tradução e revisão: Mariza Regina de Souza
(1) Nota do tradutor. “In this sign shalt thou conquer.”, “Com este sinal vencerás”, é a tradução da frase latina “In hoc signo vinces”, que, segundo o historiador Eusébio de Cesareia, foi vista no céu pelo Imperador Constantino, ao por-do-sol do dia 27 de outubro de 312, ao lado das letras “X” (qui) e “P” (ro), iniciais do nome de Cristo.
fonte: https://pt.aleteia.org/2016/04/05/com-este-sinal-venceras-quando-uma-revelacao-do-ceu-converteu-um-imperio