segunda-feira, 10 de agosto de 2020

Súplica e Encorajamento

 Sermão nº 1795

Ministrado na manhã do Dia do Senhor, 17 de agosto de 1884

Pelo Reverendo Charles H. Spurgeon

No Tabernáculo Metropolitano, Newington


Acaso, tenho eu prazer na morte do perverso? — diz o Senhor Deus; não desejo eu, antes, que ele se converta dos seus caminhos e viva? — Ezequiel 18:23

Porque não tenho prazer na morte de ninguém, diz o Senhor Deus. Portanto, convertei-vos e vivei. — Ezequiel 18:32

Dize-lhes: Tão certo como eu vivo, diz o Senhor Deus, não tenho prazer na morte do perverso, mas em que o perverso se converta do seu caminho e viva. Convertei-vos, convertei-vos dos vossos maus caminhos; pois por que haveis de morrer, ó casa de Israel? — Ezequiel 33:11

 

            O PECADO, QUANDO SE APODERA DO CORAÇÃO HUMANO, se aloja na alma como alguém que, ao tomar uma fortaleza, rapidamente tapa todas as brechas e reforça os muros para não ser invadido e expulso de lá. Dentre as armadilhas mais sutis do pecado para manter a alma debaixo do seu poder e impedir o homem de voltar-se para Deus está a difamação do Altíssimo, deturpando o Seu caráter. Assim como a poeira cega os olhos, o pecado impede o pecador de ver o Senhor da forma correta. “Bem-aventurados os limpos de coração, porque verão a Deus” (Mateus 5:8). Os ímpios, no entanto, só veem aquilo que eles mesmos pensam a respeito de Deus, e isso, infelizmente, é uma imagem totalmente diferente do que Ele realmente é! Dizem, por exemplo, que Deus é impiedoso, quando, na verdade, Ele se deleita em ser misericordioso. O servo infiel da parábola dos talentos tinha certeza disso, por isso disse taxativamente: “sabendo que és homem severo” (Mt 25.24); no entanto, a natureza de Deus é tão oposta à arrogância e à extorsão quanto a luz é das trevas. 

            Quando as pessoas colocam tal falácia na cabeça, ficam endurecidas de coração: acreditam ser inútil recorrer a Deus e continuando a pecar com mais determinação. Elas acham que Deus é implacável ou indiferente às orações humanas ou, ainda, que mesmo que Ele as ouça, não existe a menor chance de lhes dar uma resposta favorável. De uma forma sombria, pensam que Deus não liga para os culpados e miseráveis que clamam a Ele; que suas orações não são boas o suficiente, pois Ele espera tanto de suas criaturas que elas nunca oram como Lhe agrada; que, na verdade, Ele procura contender conosco, pois é um feitor cruel e fará o possível contra nós. Sendo elas mesmas tardias em perdoar, julgam ser extremamente improvável que o Senhor perdoe pecados como os delas. Como não sorriem para o pobre ou caído, acham que o Senhor nunca receberá os indignos em Seu favor. Assim, elas distorcem a imagem do Altíssimo: retratam Aquele que é o melhor dos reis como tirano; Aquele que é o amigo mais querido como inimigo; e Aquele cujo nome é amor como a personificação do ódio.  

              Esse é um dos artifícios mais malignos usados por Satanás para impedir as pessoas de se arrepender. Como nos velhos tempos da peste, quando as portas das casas eram trancadas, marcadas com uma cruz vermelha e os moradores confinados até a morte, do mesmo modo o diabo escreve na porta das pessoas: “sem esperança”, e a alma doente decide morrer sem admitir a presença do médico. Ninguém peca mais descaradamente do que quem peca em desespero, crendo que Deus não irá perdoá-lo. Um ataque onde a palavra de ordem é “sem piedade” geralmente provoca uma defesa terrível. O pirata sem esperança de perdão se torna mais sanguinário. Antigamente, muitos ladrões continuavam a matar sem remorso por pensar que seriam enforcados por causa de uma ovelha ou um cordeiro. Quando uma pessoa acredita que não há esperança, resolve fazer o que dá na telha; se não pode agradar a Deus, pelo menos, agradará a si mesma. Se tiver de ir para o inferno, irá feliz e, como se diz, “morrerá em combate”. Tudo isso é fruto de uma visão equivocada sobre Deus. Será que não percebem a semelhança entre o pecado e o engano? Eles são irmãos gêmeos. Santidade é a verdade, mas o pecado é uma mentira, a mãe de todas as mentiras. Do pecado nasce o engano e o engano nutre o pecado. O engano mantém o pecado, sobretudo, caluniando o Deus de amor. Deus está sempre pronto a perdoar e, de forma alguma, Ele é tardio em perdoar. Por que, então, as pessoas deixam de confessar seus pecados e encontrar misericórdia? Ele não é um Deus que sente prazer nas misérias humanas; por que pensam tão mal Dele? Seu ouvido não é insensível ao grito de tristeza; Seu coração não é tardio em se compadecer do aflito, pelo contrário, Ele espera para ser gracioso, “Sua misericórdia dura para sempre”; Ele tem prazer na misericórdia. Por que as pessoas fogem Dele? Deus é amor imensurável, amor constante, sem limite e sem fim.

Quem é semelhante a Ti para perdoar?

Que é tão rico em graça para salvar?

            Parte do nosso trabalho como ministros de Cristo é dar testemunho da benignidade do Senhor contra o engano com que o pecado desonra Sua bondade. E é isso o que desejo fazer nesta manhã, com toda honestidade, na esperança de que aqueles que já estão convencidos de seu pecado sejam capazes de descansar na misericórdia de Deus a mesma misericórdia que Ele revelou em Jesus Cristo, Seu Filho.

            Fiquei muito impressionado com várias cartas que recebi esta semana de almas profundamente feridas. Deus está operando em nosso meio com a espada da convicção. Senti grande alegria em receber tais cartas, pois, por mais dolorosas que tenham sido para quem as escreveu, elas me dão muita esperança. Fico triste pelas pessoas que chegam ao ponto do desespero e continuam assim; mas, qualquer coisa é melhor do que a indiferença. Não lamento pelas almas encerradas na prisão da lei, pois espero que logo saiam para a plena liberdade da fé em Cristo. Devo confessar minha preferência pelas antigas formas de convicção: para mim, elas produziam crentes melhores e mais estáveis do que os métodos superficiais mais modernos. Fico feliz em ver o Espírito Santo arruinando, derrubando e destruindo os alicerces, limpando o terreno, para que possa edificar em vocês templos para o Seu louvor. Oro com fervor para que o Senhor faça daqueles que estão convictos de seus pecados defensores das doutrinas da livre graça, consoladores dos que choram e servos consagrados do Seu reino! Espero ver grandes colheitas desse solo profundamente arado. Que o Senhor assim permita, por amor do Seu próprio nome!

            Posso ver que a ideia principal de várias pessoas que me escrevem é errônea, pois elas possuem uma falsa noção sobre Deus: elas não conseguem concebê-lo como o Deus bondoso e gracioso que Ele realmente é. Este é um erro que estou ansioso para corrigir. Ouçam-me, vocês que choram. Desejo apenas lhes dizer a mais pura verdade. Que Deus não permita que eu distorça Sua imagem só para consolá-los! Jó perguntou a seus amigos: “a favor de Deus falareis mentiras?” (Jó 13.7). E minha resposta a essa pergunta é: “Jamais”. Jamais diria aquilo que acredito ser falso a respeito do Senhor, mesmo que com isso o Maligno me acene com a possibilidade de salvar toda a humanidade. Já percebi que, em certos encontros de reavivamento, em muitos aspectos, a verdade é diminuída para dar coragem às pessoas; mas esse tipo de argumento sempre acaba mal. Consolo baseado na supressão da verdade é pior que inútil. Consolo duradouro deve alcançar os pecadores pela certeza da verdade de Deus; ou, então, no dia em que eles mais precisarem, suas esperanças se dissiparão como uma sombra. Portanto, direi a verdade, em toda a sua simplicidade, a respeito do Deus bendito, a quem sirvo. Peço que não continuem a difamar o infinito amor de Deus. Àqueles que sentem o peso do seu pecado, mas não ousam depositar sua confiança no Deus perdoador, oro para que aprendam sobre Ele e O conheçam do jeito certo, pois só assim este texto será cumprido neles: “Em ti, pois, confiam os que conhecem o teu nome” (Salmo 9.10). Que o Espírito Santo venha agora nos iluminar, para que vocês vejam Deus em Sua própria luz! Quanto a mim, sinto que é meu dever ser aquele em quem nada pode valer senão esse mesmo Espírito. Crisóstomo costumava se admirar de que algum ministro pudesse ser salvo, em vista de suas responsabilidades tão grandes; concordo plenamente com ele. Orem por mim para que eu seja fiel à alma das pessoas.

            Notem que, em cada um dos textos escolhidos, o Senhor declara não ter prazer na morte dos perversos, mas, em cada passagem subsequente, a afirmação é ainda mais forte. No primeiro, o Senhor coloca a questão em forma de pergunta. Como se pego de surpresa por tal coisa ser imputada a Ele, Deus apela para a própria razão humana e diz: “Acaso, tenho eu prazer na morte do perverso? — diz o Senhor Deus; não desejo eu, antes, que ele se converta dos seus caminhos e viva?” Ó, almas, acham mesmo que Deus deseja sua condenação? Será que são tão loucos a ponto de acreditar nessa calúnia? Acaso, por um instante sequer, tal teoria poderá ser provada? Depois de toda a bondade de Deus às multidões rebeldes, como é possível permitirem a um pensamento tão funesto ocupar sua mente, o de que Deus tem prazer em que os homens sejam pecadores e que, no final, sejam destruídos por suas iniquidades? O próprio bom senso deve ensiná-los que o bondoso Deus Se entristece ao ver os homens pecar, que Ele ficaria feliz em vê-los com a mente transformada e é triste para Ele ter de punir, no final, os obstinados e impenitentes. Ele diz com grande tristeza: “Não façais esta coisa abominável que aborreço” (Jeremias 44:4). A forma como Ele coloca a questão é de estranheza, que uma calúnia tão grosseira seja dita porque as pessoas pensam que o Deus de amor possa ter algum prazer em que os homens pereçam em seus pecados.

            E, então, no texto seguinte, Deus faz uma asserção positiva. Conhecendo o coração humano, Ele prevê que uma pergunta não seria suficiente para pôr fim a esse assunto, pois o homem diria: “Ele fez apenas uma pergunta; não deu uma declaração clara e positiva em contrário”. Assim, Ele nos dá uma garantia muito clara no segundo texto: “Porque não tenho prazer na morte de ninguém, diz o Senhor Deus. Portanto, convertei-vos e vivei”. Quando o Senhor fala, devemos acreditar nEle, pois Ele é o Deus que não pode mentir (Tt 1.2). Sabemos que essas palavras são autênticas, pois são dadas por um profeta inspirado, de cujo chamado por Deus não temos qualquer dúvida. Creiamos, então, de todo o coração. Se eu dissesse isso com base em minha própria opinião, vocês poderiam acreditar ou não; mas já que foi Deus quem disse, então, pedimos que todos, como criaturas de Deus, creiam no Criador, e jamais coloquem em dúvida Sua declaração. “Porque a palavra do rei tem poder” (Ec 8.4, ARC) — poder, creio eu, para silenciar todas as demais questões sobre a disposição de Deus para salvar.

            No entanto, como se fosse para encerrar de uma vez por todas a estranha e desagradável suposição de que Deus tem prazer na destruição humana, o terceiro texto sela a verdade com um juramento solene do Eterno. Ele eleva as mãos para o céu e jura; e, como não pode jurar por ninguém superior, Ele jura por Si mesmo — não pelo templo, nem pelo trono, nem pelos anjos, nem por qualquer outra coisa fora de Si mesmo, Ele jura por Sua própria vida. Yahweh que vive para todo o sempre, diz: “Dize-lhes: Tão certo como eu vivo, diz o Senhor Deus, não tenho prazer na morte do perverso, mas em que o perverso se converta do seu caminho e viva”. Quem ousar pôr em dúvida o juramento de Deus é culpado de insolente presunção, o que eu não gostaria de imputar a nenhum de vocês. Poderia Deus ser perjuro? Tremo só de sugerir tal coisa; no entanto, se algum de vocês não acredita no próprio juramento do Senhor, não só O faz mentiroso, como nega o valor do Seu juramento quando Ele jura por Sua própria vida. Portanto, o que Ele afirma tem de ser verdade; que nos curvemos diante disso, sem jamais duvidar. Aqueles que ousam atacar a verdade de Deus são os mais miseráveis dos homens, uma vez que Deus, para fortalecer a confiança deles, coloca a Si mesmo sob juramento. Ouçamos a voz do Senhor em Sua majestade, como o estrondo de um trovão distante — “Tão certo como eu vivo, diz o Senhor Deus, não tenho prazer na morte do perverso, mas em que o perverso se converta do seu caminho e viva”. 

            Convido-os, portanto, a considerar sinceramente tais palavras, as quais são dadas na forma de uma pergunta, uma afirmativa e um juramento solene.

1. Primeiramente, observo a asserção de que DEUS NÃO TEM PRAZER NA MORTE DO PECADOR. Realmente tenho vergonha de ter de responder à calúnia feita por algumas pessoas; ainda que seja a língua inglesa a causa de muitas dúvidas. A pessoa não quer ir a Cristo e confiar nEle porque, no obscurecimento de seus pensamentos, Deus é um ser terrível que não deseja salvá-la, não está disposto a perdoá-la, nem a recebê-la em Seu favor. Ela acha que Deus encontra algum tipo de prazer maligno na condenação da alma. Não é assim. Não preciso refutar essa mentira. Deus declara, sob juramento, exatamente o contrário, e a mentira desaparece como fumaça. Apresentarei apenas algumas evidências pelas quais vocês, que ainda estão sob a influência mortal do engano, podem ser libertos.

Em primeiro lugar, vamos considerar a exiguidade de julgamentos de Deus entre os filhos dos homens. Há pessoas que estão sempre falando sobre esses julgamentos, mas elas estão enganadas. Se um teatro pega fogo ou um barco naufraga num domingo, elas dizem: “Isso é o juízo de Deus”. No entanto, igrejas e templos pegam fogo e missionários se afogam quando estão a serviço do próprio Senhor. É um erro dizer que tudo o que acontece é juízo de Deus, pois assim cairemos no erro dos amigos de Jó, e estaremos condenando o inocente. O fato é que há poucos atos da providência divina dirigidos a pessoas que podem ser declarados, com certeza, como julgamento. É claro que eles existem, mas são incrivelmente raros nesta vida, considerando a maneira pela qual Deus é frequentemente provocado pela arrogância e pela blasfêmia. Foi um ato de julgamento quando o exército de Faraó se afogou no Mar Vermelho; foi um ato de julgamento quando Coré, Datã e Abirão foram tragados vivos pelo abismo. Mais tarde, houve julgamentos na igreja de Deus quando Ananias e Safira caíram mortos por terem mentido ao Espírito Santo; e quando Elimas, o mágico, ficou cego por se opor a Paulo. Mesmo assim, os casos são poucos e, tempos depois, instâncias autênticas são igualmente raras. Não é o próprio Senhor que diz que julgamento é “sua obra estranha”? (Isaías 28.21). Para o Seu próprio povo há constante julgamento de disciplina paterna, mas para o mundo exterior o que prevalece é o bondoso regime da misericórdia. Esta é a era da paciência e da longanimidade. Se Deus tivesse algum prazer na morte do perverso, alguns aqui já estariam no inferno há muito tempo. No entanto, Ele não os trata de acordo com seus pecados, nem os recompensa de acordo com suas iniquidades. Se Deus sempre julgasse a mentira, quantos aqui presentes já não teriam recebido sua porção no lago de fogo! Se sempre houvesse julgamento pela violação do dia de descanso, Londres já teria sido destruída tal qual Sodoma e Gomorra. Contudo, Deus reserva Sua ira para o dia da ira, pois, por enquanto, Ele faz vista grossa à obstinação humana, pois este não é o lugar do julgamento, mas da tolerância e da esperança. A escassez de obras de julgamento sobre os ímpios nesta vida prova que Deus não tem prazer nelas.

            Em segundo lugar, a duração da longanimidade de Deus antes do Dia do Juízo prova que Ele não deseja a morte de ninguém. O Senhor poupa muitos culpados por setenta anos, tolerando seus maus costumes, a fim de estimular sua gratidão. As loucuras da juventude são sucedidas pelos erros deliberados da idade adulta, e estes, pela teimosia da maturidade; mesmo assim, o Senhor continua sendo paciente! Algumas pessoas rejeitam a Cristo depois de terem ouvido o evangelho durante vários anos, reprimindo sua consciência que clama contra elas, e fazem isso a despeito do Espírito de Deus. Rebelam-se contra a luz e cometem pecados cada vez maiores, mas Deus não as destrói. Se Ele encontrasse prazer na morte, será que toleraria que vivessem por tanto tempo? Tais pessoas ocupam inutilmente a terra (cf. Lc 13.7), não por dois ou três anos como a figueira estéril, mas deixam de dar fruto na videira de Deus por quarenta ou sessenta anos; no entanto, Ele continua poupando-as! Alguns vão ainda além, pois provocam a Deus com sua incredulidade descarada, com palavras abomináveis contra o próprio Deus, contra o Seu Filho e contra o Seu povo. Tentam enfiar o dedo nos olhos de Deus, cuspir no rosto do Amado e persegui-lo na pessoa do Seu povo. Contudo, o Senhor não dá cabo deles de imediato, como seria justo fazer. Será que tais pessoas não ouvem a espada do Senhor se agitando em sua bainha? Ela já teria saltado, se a misericórdia não a tivesse empurrado de volta, implorando: “Ah! Espada do Senhor... descansa e aquieta-te!” (Jeremias 47.6). É só porque Sua compaixão nunca falha que vocês são favorecidos com os ternos convites do evangelho. Somente devido à Sua infinita paciência, a graça ainda luta contra o pecado humano e a incredulidade. Vamos, então, cada um clamar ― 

Senhor, ainda tenho vida

Não no inferno, nem em desdita!

Teu bom Espírito comigo lida  ― 

Com o maior pecador habita?

Diga aos pecadores, diga sim

Que estou fora do inferno enfim!

            Além do mais, lembrem-se da perfeição do caráter de Deus como Regente moral do Universo. Ele é o Juiz de tudo, e deve fazer o que é certo. Ora, se um juiz em sua tribuna fosse conhecido por ter prazer em punir criminosos, ele deveria ser afastado do cargo, pois ficaria claro que ele seria totalmente inadequado para o exercício de sua função. Quem tem prazer em mandar alguém para a forca ou para a prisão é da mesma laia que o Juiz JeffreysNT2 e outros monstros do tipo, os quais, estou certo, foram expurgados definitivamente de nossos tribunais. No entanto, se eu soubesse que um juiz nunca deu uma sentença de morte sem lágrimas nos olhos, que, quando vai para casa depois do trabalho, fica pensando nas pessoas que foram banidas da sociedade para sempre por causa de suas sentenças, que fica triste e infeliz a toda a noite, eu diria: “Sim, esse é o tipo de pessoa que deve ser juiz”. Em um juiz, aversão à punição é necessária à justiça. Deus é assim; Ele não tem prazer no pecado, nem na punição decorrente do pecado; Ele odeia tanto um quanto o outro, e só chega às vias de fato quando tudo o mais falha. Quando o pecador precisa ser condenado, para que a sociedade não saia dos trilhos, só então Ele profere a terrível sentença. No entanto, ainda assim é com genuína relutância, pois Ele diz: “Como posso desistir de ti”? No texto, parece que o Grande Juiz de todas as coisas desce da glória da Sua tribuna e mostra Sua face, dizendo: “Julguei, condenei e castiguei, mas, tão certo como vivo, não tenho prazer em tudo isso, meu prazer está nas pessoas que se voltam para mim e vivem”.

            Se qualquer outro pensamento fosse necessário para corrigir a desconfiança de vocês, eu poderia mencionar a graciosidade da obra do Senhor em salvar aqueles que deixam seus maus caminhos. O cuidado com que o Altíssimo conduz ao arrependimento, a boa vontade com que Ele aceita o arrependido e o amor abundante manifestado aos pródigos que retornam são evidências inquestionáveis de que Deus não tem prazer na morte do perverso, e sim na sua salvação. Para impedir a morte do perverso, o Senhor concebeu um plano de salvação antes da fundação do mundo, e aqueles que aceitam esse plano descobrem que o Senhor proveu um Substituto para eles, na pessoa de Seu Filho amado, O qual, na verdade, é Ele mesmo, e que na Sua própria pessoa Deus suportou a pena devida ao pecado; e que, dessa forma, a lei foi solenemente cumprida e a justiça divina satisfeita. O Senhor foi pendurado no madeiro e ali deu Sua vida, para que Ele mesmo seja justo e justificador daquele que tem fé em Jesus (Romanos 3.26): acaso isso não prova o Seu deleite na salvação? O Espírito Santo vem com o propósito de renovar o coração e retirar dele a dureza, a fim de que as pessoas se tornem ternas e penitentes ― porventura isso não prova Seu prazer em salvar? Todos os recursos emanam espontaneamente da Divindade para a salvação daqueles que abandonam seus pecados. Sim, tais recursos saem antes que as pessoas se convertam, a fim de que elas sejam dissuadidas e transformadas. Deus é encontrado até mesmo por aqueles que não O buscam, Ele dispensa Sua graça antes que clamem a Ele, não depois. Como se Deus Se tivesse ficado indignado com a acusação de que Ele tem prazer na morte de alguém, Ele preferiu Ele mesmo morrer no madeiro a deixar um mundo de pecadores sucumbir no inferno. Para provar Seu desejo de que os homens vivam, Seu filho habitou por mais de trinta anos neste mundo indigno como homem entre os homens, e Seu Santo Espírito tem habitado neles por todos estes séculos, suportando todas as provocações de um povo ingrato e sem entendimento. Deus demonstra de várias maneiras que não é o Destruidor, e sim o Preservador da humanidade. “O nosso Deus é o Deus libertador” (Salmo 68:20). “Do Senhor é a salvação” (Salmo 3.8).

            Assim sendo, tentarei demonstrar os caminhos de Deus para o homem. Quando alguém é levado a julgamento, seus amigos, se puderem, vão até a prisão e dizem: “Olha, quem vai presidir o julgamento não é o Juiz Fulano de Tal, que não dá moleza; você vai ser julgado pela pessoa mais bondosa do tribunal”. Muitos prisioneiros se enchem de coragem com uma notícia dessas. Ah, pobre pecador, você que não quer acreditar em Deus, deixe-me dar-lhe esta esperança, lembrando-o de que é o Amor encarnado quem está no tribunal; Ele é quem deve e quem vai condená-lo, a menos que você abandone seus pecados, embora Ele não sinta prazer nessa condenação, nem esteja disposto a mostrar o machado da execuçãoNT4. Por que não se converte a Ele e vive? Será que as misericórdias do Senhor (Lm 3.22) não o convidam a se render completamente a Ele e achar graça aos Seus olhos?

 2. Agora, em segundo lugar, DEUS NÃO TEM ALTERNATIVA, SENÃO QUE O HOMEM SE CONVERTA DO SEUS MAUS CAMINHOS OU MORRA. “Não tenho prazer na morte do perverso, mas em que o perverso se converta do seu caminho e viva”. É uma coisa ou outra: conversão ou perdição. Deus, com todo o Seu amor pelo homem, não pode dar alternativa: o homem não pode continuar em seus pecados e, ainda assim, ser salvo. O pecado precisa morrer ou quem morre é o pecador.

            Portanto, a primeira coisa a saber é que, quando Deus proclama Sua misericórdia ao homem sob essa condição ― que o homem deve se converter dos seus maus caminhos, isso decorre única e exclusivamente da Sua graça. Por uma simples questão de direito, o arrependimento não traz consigo a misericórdia. Acaso um assassino é perdoado só porque se arrepende do que fez? Porventura um ladrão escapa da prisão só porque, no final, lamenta não ter sido honesto? O arrependimento não repara o mal que foi feito; o dano permanece, e o castigo precisa ser aplicado. Assim sendo, é a graça que me permite dizer: “Convertei-vos, convertei-vos dos vossos maus caminhos”. É porque, por detrás do arrependimento existe um grande sacrifício; é por meio de um sacrifício totalmente suficiente que ele se torna aceitável. O Filho de Deus derramou Seu sangue na cruz e morreu, fazendo expiação pelo pecado; agora Ele é exaltado nas alturas, para dar arrependimento e remissão de pecados. Hoje, a palavra de Deus é: “Arrependei-vos e crede no evangelho” (Mc 1.15). “Se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados e nos purificar de toda injustiça” (1 João 1:9). Isso não é segundo a lei, que não dá espaço para o arrependimento, é uma questão puramente da graça. Deus nos salva não devido a qualquer mérito da nossa parte, mas porque Ele tem misericórdia de quem quer (Romanos 9.18) e decretou salvar a todos quantos se desviam dos caminhos do mal.

            A seguir, observem que, se não houver arrependimento, deve haver punição, pois qualquer outra teoria seria o fim do governo moral. A pior coisa que poderia acontecer à humanidade seria Deus dizer: “Retiro a minha lei; não recompensarei a virtude, nem punirei a iniquidade; façam o que quiserem”. Isso seria realmente o inferno na terra. O maior inimigo do governo civil entre os homens é aquele que prega a salvação universal ― a salvação sem mudança do coração e da vida. Tais professores são um perigo para a ordem nacional, pois removem os alicerces da comunidade. É quase como se dissessem: “Façam como quiserem; pode ser que, durante algum tempo, haja uma pequena diferença, mas logo passará, e mocinhos e bandidos dividirão o céu do mesmo jeito”. Esse tipo de conversa é detestável! Não posso dizer menos que isso. Para que haja governo, não pode haver impunidade; ser complacente com o desonesto é ser cruel com o prejudicado. Salvar o assassino é matar o inocente. Seria uma catástrofe para o céu e a terra se pudesse ser provado que Deus poderia recompensar justos e injustos da mesma forma: os alicerces seriam removidos, e os justos o que fariam? (Salmo 11.3). Um Deus que não é quem deveria ser seria um pobre Governante do universo.

            Sim, meus ouvintes, o pecado precisa ser punido; ou você o abandona ou morre, pois o pecado é o seu próprio castigo. Quando falamos sobre o fogo que nunca se apaga e sobre o verme que nunca morre, supõe-se que estejamos falando de coisas literais, mas, na verdade, são figuras, figuras que representam algo muito mais terrível que elas mesmas: o fogo são as chamas da furiosa rebelião da alma e o verme é a tortura de uma consciência que nunca morre. Pecado é o inferno. Nas entranhas da desobediência existe um mundo de miséria. Deus nos constituiu de tal forma, e com razão, que não podemos mais ser perversos e felizes ao mesmo tempo; quando erramos, acabamos nos sentindo miseráveis; e, quanto mais errados estivermos, e mais continuarmos no erro, com mais certeza estaremos acumulando tristezas por nós mesmos pela eternidade afora. Santidade e justiça produzem felicidade, mas iniquidade e engano devem, por necessidade de uma natureza que não pode ser mudada, produzir tribulação e angústia. É assim que deve ser. Mesmo a onipotência de Deus não pode fazer feliz um pecador impenitente. Você precisa abandonar o pecado ou se tornará miserável; você precisa renunciar ao pecado ou renunciará à toda esperança de uma eternidade feliz. Você não pode se casar com Cristo e o céu enquanto não se divorciar do pecado e de si mesmo.

            Quando a consciência de alguém é totalmente honesta, creio que ela dá testemunho disso. Mas existem algumas consciências bem curiosas ― tão distorcidas que, de forma alguma, são consciências de verdade. Vejo pessoas agindo deliberadamente de má-fé, mas falando sobre verdade e santidade. No entanto, quando a consciência não está embriagada com o vinho misto da soberba e da incredulidade dirá que, quando se faz o mal, não se pode esperar receber aprovação; e, quando se deixa de fazer o bem, não se pode esperar receber a mesma recompensa de quando se faz ― que, de fato, deve haver, na natureza das coisas, uma punição atrelada ao crime. A consciência fala, e agora é o próprio Deus, que não tem prazer na morte do perverso, que diz ― você precisa se arrepender, ou vai morrer. Se continuar nos seus maus caminhos, estará perdido. É preciso abandonar o pecado, ou o Deus Altíssimo nunca poderá olhá-lo com favor. Estão me ouvindo? Que isso penetre profundamente em seu coração e produza arrependimento!

  3. Isso me leva ao terceiro ponto, o qual é maravilhoso: DEUS TEM PRAZER NO HOMEM QUE ABANDONA O SEU PECADO. Leia de novo a passagem: “Dize-lhes: Tão certo como eu vivo, diz o Senhor Deus, não tenho prazer na morte do perverso, mas em que o perverso se converta do seu caminho e viva”. Dentre as maiores alegrias divinas está o prazer de ver um pecador se afastar do mal. Deus Se deleita nas primeiras vezes em que as pessoas começam a pensar nEle e começam a meditar nos Seus caminhos e a considerar a sua própria condição diante dEle, quando até então nem se importavam com isso. Ele vê com prazer aqueles que outrora foram rebeldes e insensatos, mas que, finalmente, começam a pensar na eternidade e a avaliar o futuro de pecado e juízo. Quando você ouve o convite: “Buscai o Senhor enquanto se pode achar, invocai-o enquanto está perto” (Isaías 55:6), Deus tem prazer em observar sua atenção. Quando você começa a se aperceber da sua situação e diz: “Sinto tanto pelo meu pecado; quisera nunca tê-lo cometido!”, Ele ouve o seu suspiro. Quando o seu coração está cansado de pecar, quando você detesta o mal e sente que, embora não consiga se afastar dele, se pudesse o faria, então Ele olha para você com olhar compassivo. Quando, por Sua graça, existe uma vontade renovada brotando no seu coração ― vontade de crer e obedecer, então o Pai também sorri. Quando Ele ouve o seu interior, gemendo e ansiando pela casa e pelo seio do Pai, você não pode vê-lO, mas Ele está escutando você atrás da porta. Sua mão está secretamente recolhendo suas lágrimas em Seu odre (Salmo 56.8) e Seu coração está cheio de compaixão por você. “Agrada-se o Senhor dos que o temem e dos que esperam na sua misericórdia” (Salmos 147:11). Observe ainda esta última característica: a pessoa só tem um pouquinho de esperança, mas mesmo assim o Senhor tem prazer nela. Mesmo que a boa obra ocorra apenas no entardecer, Deus tem tanto prazer nela quanto um sentinela se alegra com os primeiros raios da manhã; sim, Ele fica mais feliz do que aqueles que esperam o amanhecer. E, quando você finalmente começa a orar, clamando: “Ó Deus, sê propício a mim, pecador!” (Lucas 18:13), Ele também tem prazer, pois vê sinais claros de que você está caindo em si e indo para Ele. Seu Espírito diz: “Veja, ele está orando”, e Ele toma isso como um sinal permanente. Quando você abandona sinceramente o pecado, Deus o vê fazendo isso e fica tão feliz que os santos anjos contemplam a Sua alegria.

            Tenho certeza de que Deus vê as lutas daqueles que se esforçam para fugir dos velhos hábitos e dos maus caminhos. Quando tentam subjugar os maus pensamentos; quando, à noite, sentam-se e lamentam as falhas que tiveram ao longo do dia por não terem ido tão bem quanto esperavam, o Senhor observa os seus desejos e lamentos. Do mesmo modo que uma mãe observa com ternura seus filhos quando começam a andar, e sorri quando eles vão vacilantes de uma cadeira para outra, estendendo a mão para ajudá-los, Deus também tem prazer nas nossas primeiras tentativas de sermos santos, nos nossos desejos de vencer o pecado, nos nossos suspiros e clamores para sermos libertos do cativeiro da corrupção. Ele disse: “Todavia, eu ensinei a andar a Efraim; tomei-os nos meus braços” (Oséias 11:3), e da mesma maneira Ele está nos ensinando.

            Vou lhes contar que o que mais agrada a Deus é quando alguém recebe Seu Filho amado e fala: “Senhor, algo me diz que não há esperança para mim, mas não acredito nessa voz. Li na Tua Palavra que não lançarás fora quem se achegar a Ti, e eis que eu me achego! Sou o maior dos pecadores, mas, Senhor, creio na Tua promessa; sou tão indigno quanto o próprio diabo, mas Tu, Senhor, não pedes dignidade, somente fé como a de uma criança. Não me lances fora ― eu descanso em Ti”. “Sem fé é impossível agradar a Deus” (Hb 11.6), mas Deus sente um prazer divino ao ver o primeiro grãozinho de fé no coração do pobre pecador transformado. Gostaria tanto que pensassem nisso, todos vocês que continuam se autocondenando! Quando recebo suas cartas cheias de autocondenação, isso me agrada; e, se agrada, tenho certeza de que agrada muito mais a Deus, pois Ele é infinitamente mais terno que eu, embora eu tente humildemente imitá-lO. Ah, como gostaria de poder fazê-los confiar no meu Senhor e acabar com seus medos e dúvidas cruéis!

Dúvidas e raciocínios falazes estão

Pregados na cruz desde então

O argumento mais convincente de Deus é a morte sangrenta de Seu Filho na cruz. Ah, grande pecador, converta-se ao Senhor e Ele terá prazer na sua conversão! Sabia que todos os seus pensamentos sobre Ele são soprados pelo Seu Espírito? Todos os pesares pelo pecado, todos os desejos de santidade e, especialmente, toda confiança em Cristo e toda a esperança na Sua misericórdia, tudo isso é obra do Espírito Santo: todas essas coisas nunca seriam encontradas na sua alma se Ele não as tivesse colocado lá. Se vir uma linda flor crescendo num monte do esterco, concluo que um jardineiro esteve por lá e lançou ali uma semente. E, quando vejo uma alma começando a orar, a ter esperança e crer, digo a mim mesmo: “Deus está lá. O Espírito Santo está em ação, ou não haveria a menor confiança, nem a mais leve esperança”. Portanto, tenha coragem, você está se aproximando de um Deus cheio de graça e favor.

            Durante a sua vida, quando continuar na luta contra o pecado e se consagrar a Jesus, quando lavar os pés do Salvador com suas lágrimas e enxugá-los com seus cabelos como Maria Madalena, ou quando quebrar o vaso de alabastro e derramar seu bálsamo precioso na cabeça do Mestre como Maria, o Senhor terá grande prazer em você por amor a Jesus. Ele não tem prazer em gemidos e gritos do inferno, mas Se alegra no arrependimento dos pecadores. O fogo do inferno não Lhe dá satisfação alguma, mas pecadores penitentes batendo no peito e crentes contemplando Cristo com olhos cheios de lágrimas são um espetáculo majestoso para Ele. É assim, Ele jura, então é verdade. Pare de fugir e creia na vida eterna.

  4. Finalmente, uma vez que Ele tem prazer em que o homem se converta a Ele, DEUS O EXORTA A FAZER ISSO, E ACRESCENTA UMA RAZÃO. “Convertei-vos, convertei-vos dos vossos maus caminhos; pois por que haveis de morrer, ó casa de Israel?”. Deus percebe sua pobre criatura dando-Lhe as costas, olhando para os ídolos, olhando para os prazeres pecaminosos, olhando para a cidade da destruição, e o que Ele diz? Ele diz: “Converta-se!” A direção é muito clara, não é? “Converta-se”, ou “siga na direção certa!”. Isso é tudo. Mas alguém diz: “Pensei que deveria sentir muita angústia e agonia”. Não vou estranhar se você sentir isso, mas tudo o que Deus diz é: “Converta-se”. Agora você está indo na direção errada; “converta-se” e vá na direção certa. Essa conversão é o verdadeiro arrependimento. Mudança de vida é a essência do arrependimento, e ela precisa brotar de um coração transformado, de um desejo transformado, de uma vontade transformada. Deus disse: “Convertei-vos!” Oh, que vocês ouçam e obedeçam!

            Observem que Ele coloca a frase no presente ― “Convertei-vos”; não amanhã, mas agora. Ninguém será salvo amanhã: todos aqueles que são salvos, são salvos hoje. “Eis, agora, o tempo sobremodo oportuno” (2Co 6.2). “Convertei-vos”. Que pela infinita misericórdia de Deus, O qual permitirá que vocês se convertam, oro para que vocês se convertam dos seus maus caminhos, da sua autoconfiança, e se voltem para Ele. Não é uma conversão qualquer, mas uma conversão para Deus. Se o Senhor o converter, converta-se a Ele, e confie somente nEle, para servi-lO e para temê-lO.

            “Convertei-vos, convertei-vos”. Vejam, o Senhor fala duas vezes. Essas repetições querem dizer que Ele quer o seu bem. Suponham que eu visse um empregado meu atravessando um rio e percebesse que logo não daria mais pé para ele, e assim, estaria em grande perigo; suponham que eu gritasse para ele: “Pare! Pare! Se der mais um passo, vai se afogar. Volte! Volte!” Será que alguém se atreveria a dizer: “Pastor, ficaria contente se ele se afogasse”? Seria cruel demais. Quem insinua uma coisa dessas, quando estou pedindo a meu empregado que volte e salve sua vida, só pode ser um grande mentiroso! Acaso Deus diria para escaparmos da morte se Ele realmente não desejasse isso? Creio que não. Todo pecador pode ter certeza de que Deus não sente prazer na sua morte quando insta com ele com estas palavras incomparáveis: “Convertei-vos, convertei-vos dos vossos maus caminhos; pois por que haveis de morrer”? Nestas palavras ― “Convertei-vos, convertei-vos” ― há o que os antigos teólogos chamavam de reiteração, um gemido interno, uma duplicação da súplica. A cada súplica, Deus é mais enfático. Será que vocês vão ouvir?   

            E, então, Ele conclui pedindo aos homens que encontrem uma razão pela qual devam morrer. Deve haver uma boa razão para alguém desejar a morte. “Por que haveis de morrer”? Esta é uma pergunta sem resposta, com relação à morte eterna. Será que existe alguma coisa desejável em ficar eternamente afastado da presença do Senhor e da glória do Seu poder? Haveria algum ganho em perder a própria alma? Haveria algum benefício em ir para o castigo eterno? Haveria algo desejável e almejável em ser lançado no inferno, onde o verme nunca morre e o fogo nunca se apaga? Ó, almas, não sejam irracionais! Não negligenciem tão grande salvação! Deve ser a pior coisa do mundo morrer nos próprios pecados; por que escolheriam isso? Querem naufragar? Por que navegar perto da costa rochosa e brincar com fogo? Vocês comeriam os doces envenenados do pecado só porque são adoçados com um pouquinho de prazer do presente? No final, o fel de amargura encherá suas entranhas. Não sou bajulador: não me atrevo a ser, pois eu os amo e gostaria de persuadi-los a se converterem ao Senhor. Há uma flor que sempre se volta para o sol; tomara vocês se voltem da mesma forma para Deus! Por que dar as costas a Ele? “POR QUÊ?” é apenas uma palavrinha, mas quanto é preciso para atender às suas exigências! POR QUE continuar no pecado? Por que não crer no Salvador? Por que provocar a Deus? POR QUE morrer? Dê a volta e diga: “Ó, Senhor, não posso suportar a ideia da morte eterna, por isso, não posso continuar a viver em pecado. Que a Tua imensa graça me ajude”!

            Oxalá vocês creiam no Senhor Jesus! Descansem nEle e na Sua obra consumada, e tudo irá bem. Será que ouvi alguém dizer: “Vou orar por isso”? É melhor crer de uma vez por todas. Depois disso, ore o quanto quiser. O que há de bom nas orações incrédulas? “Depois do culto vou conversar com alguém consagrado”. Creia primeiro em Jesus. Vá para casa sozinho, crendo em Cristo. “Gostaria de ir à sala de decisãoNT3”. Ouso dizer que deveria, mas não estamos dispostos a ceder à superstição popular. Receio que em tais salas as pessoas fiquem empolgadas com uma convicção fictícia. Pouquíssimos supostos convertidos das salas de decisão se saem bem. Volte-se para Deus de uma vez por todas, esteja onde estiver. Lance-se sobre Cristo já, de uma vez, antes de dar mais um passo! Em nome do Senhor eu lhe digo: creia no Senhor Jesus Cristo, pois “Quem crer e for batizado será salvo; quem, porém, não crer será condenado” (Marcos 16:16)

Tradução e revisão: Mariza Regina de Souza



NT1 — A Peste Negra, uma pandemia de peste bubônica que atingiu a Europa em 1347, se espalhou para a Inglaterra em 1348, matando entre um terço e metade dos habitantes do país. (fonte: http://molhoingles.com/a-peste-negra-na-inglaterra/)

NT2 — George Jeffreys (1645-1689), juiz inglês notório por sua crueldade e corrupção (https://www.britannica.com/biography/George-Jeffreys-1st-Baron-Jeffreys-of-Wem)

NT3 — Numa tradução livre, “sala da decisão”, sala onde eram feitas perguntas para que a pessoa pudesse “se decidir por Cristo”. v. Spurgeon: Prince of Preachers, Lewis A. Drummond, p. 309, Kregel Publications, Grand Rapids,1992, MI 49501.

NT4 — machado que era usado para decapitar condenados à morte