Sermão nº 1795
Ministrado na manhã do Dia do
Senhor, 17 de agosto de 1884
Pelo Reverendo Charles H.
Spurgeon
No Tabernáculo Metropolitano,
Newington
Acaso, tenho eu prazer na morte do perverso? — diz
o Senhor Deus; não desejo eu, antes, que ele se converta dos seus caminhos e
viva? — Ezequiel 18:23
Porque não tenho prazer na morte de ninguém, diz o
Senhor Deus. Portanto, convertei-vos e vivei. — Ezequiel 18:32
Dize-lhes: Tão certo como eu vivo, diz o Senhor
Deus, não tenho prazer na morte do perverso, mas em que o perverso se converta
do seu caminho e viva. Convertei-vos, convertei-vos dos vossos maus caminhos;
pois por que haveis de morrer, ó casa de Israel? — Ezequiel 33:11
O PECADO, QUANDO SE APODERA DO
CORAÇÃO HUMANO, se aloja na alma como alguém que, ao tomar uma fortaleza,
rapidamente tapa todas as brechas e reforça os muros para não ser invadido e
expulso de lá. Dentre as armadilhas mais sutis do pecado para manter a alma
debaixo do seu poder e impedir o homem de voltar-se para Deus está a difamação
do Altíssimo, deturpando o Seu caráter. Assim como a poeira cega os olhos, o
pecado impede o pecador de ver o Senhor da forma correta. “Bem-aventurados os
limpos de coração, porque verão a Deus” (Mateus 5:8). Os ímpios, no entanto, só
veem aquilo que eles mesmos pensam a respeito de Deus, e isso, infelizmente, é
uma imagem totalmente diferente do que Ele realmente é! Dizem, por exemplo, que
Deus é impiedoso, quando, na verdade, Ele se deleita em ser misericordioso. O
servo infiel da parábola dos talentos tinha certeza disso, por isso disse
taxativamente: “sabendo que és homem severo” (Mt 25.24); no entanto, a natureza
de Deus é tão oposta à arrogância e à extorsão quanto a luz é das trevas.
Quando as pessoas colocam tal
falácia na cabeça, ficam endurecidas de coração: acreditam ser inútil recorrer
a Deus e continuando a pecar com mais determinação. Elas acham que Deus é
implacável ou indiferente às orações humanas ou, ainda, que mesmo que Ele as
ouça, não existe a menor chance de lhes dar uma resposta favorável. De uma
forma sombria, pensam que Deus não liga para os culpados e miseráveis que
clamam a Ele; que suas orações não são boas o suficiente, pois Ele espera tanto
de suas criaturas que elas nunca oram como Lhe agrada; que, na verdade, Ele
procura contender conosco, pois é um feitor cruel e fará o possível contra nós.
Sendo elas mesmas tardias em perdoar, julgam ser extremamente improvável que o
Senhor perdoe pecados como os delas. Como não sorriem para o pobre ou caído,
acham que o Senhor nunca receberá os indignos em Seu favor. Assim, elas
distorcem a imagem do Altíssimo: retratam Aquele que é o melhor dos reis como
tirano; Aquele que é o amigo mais querido como inimigo; e Aquele cujo nome é
amor como a personificação do ódio.
Esse é um dos artifícios mais
malignos usados por Satanás para impedir as pessoas de se arrepender. Como nos
velhos tempos da peste, quando as portas das casas eram trancadas, marcadas com
uma cruz vermelha e os moradores confinados até a morte, do mesmo modo o diabo
escreve na porta das pessoas: “sem esperança”, e a alma doente decide morrer
sem admitir a presença do médico. Ninguém peca mais descaradamente do que quem
peca em desespero, crendo que Deus não irá perdoá-lo. Um ataque onde a palavra
de ordem é “sem piedade” geralmente provoca uma defesa terrível. O pirata sem
esperança de perdão se torna mais sanguinário. Antigamente, muitos ladrões
continuavam a matar sem remorso por pensar que seriam enforcados por causa de
uma ovelha ou um cordeiro. Quando uma pessoa acredita que não há esperança,
resolve fazer o que dá na telha; se não pode agradar a Deus, pelo menos,
agradará a si mesma. Se tiver de ir para o inferno, irá feliz e, como se diz,
“morrerá em combate”. Tudo isso é fruto de uma visão equivocada sobre Deus.
Será que não percebem a semelhança entre o pecado e o engano? Eles são irmãos
gêmeos. Santidade é a verdade, mas o pecado é uma mentira, a mãe de todas as
mentiras. Do pecado nasce o engano e o engano nutre o pecado. O engano mantém o
pecado, sobretudo, caluniando o Deus de amor. Deus está sempre pronto a perdoar
e, de forma alguma, Ele é tardio em perdoar. Por que, então, as pessoas deixam
de confessar seus pecados e encontrar misericórdia? Ele não é um Deus que sente
prazer nas misérias humanas; por que pensam tão mal Dele? Seu ouvido não é
insensível ao grito de tristeza; Seu coração não é tardio em se compadecer do
aflito, pelo contrário, Ele espera para ser gracioso, “Sua misericórdia dura
para sempre”; Ele tem prazer na misericórdia. Por que as pessoas fogem Dele?
Deus é amor imensurável, amor constante, sem limite e sem fim.
Quem é semelhante a Ti para
perdoar?
Que é tão
rico em graça para salvar?
Parte do nosso trabalho como
ministros de Cristo é dar testemunho da benignidade do Senhor contra o engano
com que o pecado desonra Sua bondade. E é isso o que desejo fazer nesta manhã,
com toda honestidade, na esperança de que aqueles que já estão convencidos de
seu pecado sejam capazes de descansar na misericórdia de Deus — a mesma
misericórdia que Ele revelou em Jesus Cristo, Seu Filho.
Fiquei muito impressionado com
várias cartas que recebi esta semana de almas profundamente feridas. Deus está
operando em nosso meio com a espada da convicção. Senti grande alegria em
receber tais cartas, pois, por mais dolorosas que tenham sido para quem as
escreveu, elas me dão muita esperança. Fico triste pelas pessoas que chegam ao
ponto do desespero e continuam assim; mas, qualquer coisa é melhor do que a
indiferença. Não lamento pelas almas encerradas na prisão da lei, pois espero
que logo saiam para a plena liberdade da fé em Cristo. Devo confessar minha
preferência pelas antigas formas de convicção: para mim, elas produziam crentes
melhores e mais estáveis do que os métodos superficiais mais modernos. Fico
feliz em ver o Espírito Santo arruinando, derrubando e destruindo os alicerces,
limpando o terreno, para que possa edificar em vocês templos para o Seu louvor.
Oro com fervor para que o Senhor faça daqueles que estão convictos de seus
pecados defensores das doutrinas da livre graça, consoladores dos que choram e
servos consagrados do Seu reino! Espero ver grandes colheitas desse solo
profundamente arado. Que o Senhor assim permita, por amor do Seu próprio nome!
Posso ver que a ideia principal de
várias pessoas que me escrevem é errônea, pois elas possuem uma falsa noção
sobre Deus: elas não conseguem concebê-lo como o Deus bondoso e gracioso que
Ele realmente é. Este é um erro que estou ansioso para corrigir. Ouçam-me,
vocês que choram. Desejo apenas lhes dizer a mais pura verdade. Que Deus não
permita que eu distorça Sua imagem só para consolá-los! Jó perguntou a seus
amigos: “a favor de Deus falareis mentiras?” (Jó 13.7). E minha resposta a essa
pergunta é: “Jamais”. Jamais diria aquilo que acredito ser falso a respeito do
Senhor, mesmo que com isso o Maligno me acene com a possibilidade de salvar
toda a humanidade. Já percebi que, em certos encontros de reavivamento, em
muitos aspectos, a verdade é diminuída para dar coragem às pessoas; mas esse
tipo de argumento sempre acaba mal. Consolo baseado na supressão da verdade é
pior que inútil. Consolo duradouro deve alcançar os pecadores pela certeza da
verdade de Deus; ou, então, no dia em que eles mais precisarem, suas esperanças
se dissiparão como uma sombra. Portanto, direi a verdade, em toda a sua
simplicidade, a respeito do Deus bendito, a quem sirvo. Peço que não continuem
a difamar o infinito amor de Deus. Àqueles que sentem o peso do seu pecado, mas
não ousam depositar sua confiança no Deus perdoador, oro para que aprendam
sobre Ele e O conheçam do jeito certo, pois só assim este texto será cumprido
neles: “Em ti, pois, confiam os que conhecem o teu nome” (Salmo 9.10). Que o
Espírito Santo venha agora nos iluminar, para que vocês vejam Deus em Sua
própria luz! Quanto a mim, sinto que é meu dever ser aquele em quem nada pode
valer senão esse mesmo Espírito. Crisóstomo costumava se admirar de que algum
ministro pudesse ser salvo, em vista de suas responsabilidades tão grandes;
concordo plenamente com ele. Orem por mim para que eu seja fiel à alma das
pessoas.
Notem que, em cada um dos textos
escolhidos, o Senhor declara não ter prazer na morte dos perversos, mas, em
cada passagem subsequente, a afirmação é ainda mais forte. No primeiro, o
Senhor coloca a questão em forma de pergunta. Como se pego de surpresa por tal
coisa ser imputada a Ele, Deus apela para a própria razão humana e diz: “Acaso,
tenho eu prazer na morte do perverso? — diz o Senhor Deus; não desejo eu,
antes, que ele se converta dos seus caminhos e viva?” Ó, almas, acham mesmo que
Deus deseja sua condenação? Será que são tão loucos a ponto de acreditar nessa
calúnia? Acaso, por um instante sequer, tal teoria poderá ser provada? Depois
de toda a bondade de Deus às multidões rebeldes, como é possível permitirem a
um pensamento tão funesto ocupar sua mente, o de que Deus tem prazer em que os
homens sejam pecadores e que, no final, sejam destruídos por suas iniquidades?
O próprio bom senso deve ensiná-los que o bondoso Deus Se entristece ao ver os
homens pecar, que Ele ficaria feliz em vê-los com a mente transformada e é
triste para Ele ter de punir, no final, os obstinados e impenitentes. Ele diz
com grande tristeza: “Não façais esta coisa abominável que aborreço” (Jeremias
44:4). A forma como Ele coloca a questão é de estranheza, que uma calúnia tão
grosseira seja dita porque as pessoas pensam que o Deus de amor possa ter algum
prazer em que os homens pereçam em seus pecados.
E, então, no texto seguinte, Deus
faz uma asserção positiva. Conhecendo o coração humano, Ele prevê que uma
pergunta não seria suficiente para pôr fim a esse assunto, pois o homem diria:
“Ele fez apenas uma pergunta; não deu uma declaração clara e positiva em
contrário”. Assim, Ele nos dá uma garantia muito clara no segundo texto:
“Porque não tenho prazer na morte de ninguém, diz o Senhor Deus. Portanto,
convertei-vos e vivei”. Quando o Senhor fala, devemos acreditar nEle, pois Ele
é o Deus que não pode mentir (Tt 1.2). Sabemos que essas palavras são
autênticas, pois são dadas por um profeta inspirado, de cujo chamado por Deus
não temos qualquer dúvida. Creiamos, então, de todo o coração. Se eu dissesse
isso com base em minha própria opinião, vocês poderiam acreditar ou não; mas já
que foi Deus quem disse, então, pedimos que todos, como criaturas de Deus,
creiam no Criador, e jamais coloquem em dúvida Sua declaração. “Porque a
palavra do rei tem poder” (Ec 8.4, ARC) — poder, creio eu, para silenciar todas
as demais questões sobre a disposição de Deus para salvar.
No entanto, como se fosse para
encerrar de uma vez por todas a estranha e desagradável suposição de que Deus
tem prazer na destruição humana, o terceiro texto sela a verdade com um
juramento solene do Eterno. Ele eleva as mãos para o céu e jura; e, como não
pode jurar por ninguém superior, Ele jura por Si mesmo — não pelo templo, nem
pelo trono, nem pelos anjos, nem por qualquer outra coisa fora de Si mesmo, Ele
jura por Sua própria vida. Yahweh que vive para todo o sempre, diz: “Dize-lhes:
Tão certo como eu vivo, diz o Senhor Deus, não tenho prazer na morte do
perverso, mas em que o perverso se converta do seu caminho e viva”. Quem ousar
pôr em dúvida o juramento de Deus é culpado de insolente presunção, o que eu
não gostaria de imputar a nenhum de vocês. Poderia Deus ser perjuro? Tremo só
de sugerir tal coisa; no entanto, se algum de vocês não acredita no próprio
juramento do Senhor, não só O faz mentiroso, como nega o valor do Seu juramento
quando Ele jura por Sua própria vida. Portanto, o que Ele afirma tem de ser
verdade; que nos curvemos diante disso, sem jamais duvidar. Aqueles que ousam
atacar a verdade de Deus são os mais miseráveis dos homens, uma vez que Deus,
para fortalecer a confiança deles, coloca a Si mesmo sob juramento. Ouçamos a
voz do Senhor em Sua majestade, como o estrondo de um trovão distante — “Tão
certo como eu vivo, diz o Senhor Deus, não tenho prazer na morte do perverso,
mas em que o perverso se converta do seu caminho e viva”.
Convido-os, portanto, a considerar
sinceramente tais palavras, as quais são dadas na forma de uma pergunta, uma
afirmativa e um juramento solene.
1. Primeiramente, observo a
asserção de que DEUS NÃO TEM PRAZER NA MORTE DO PECADOR. Realmente tenho
vergonha de ter de responder à calúnia feita por algumas pessoas; ainda que
seja a língua inglesa a causa de muitas dúvidas. A pessoa não quer ir a Cristo
e confiar nEle porque, no obscurecimento de seus pensamentos, Deus é um ser
terrível que não deseja salvá-la, não está disposto a perdoá-la, nem a
recebê-la em Seu favor. Ela acha que Deus encontra algum tipo de prazer maligno
na condenação da alma. Não é assim. Não preciso refutar essa mentira. Deus
declara, sob juramento, exatamente o contrário, e a mentira desaparece como
fumaça. Apresentarei apenas algumas evidências pelas quais vocês, que ainda
estão sob a influência mortal do engano, podem ser libertos.
Em primeiro lugar, vamos considerar a exiguidade de
julgamentos de Deus entre os filhos dos homens. Há pessoas que estão sempre
falando sobre esses julgamentos, mas elas estão enganadas. Se um teatro pega
fogo ou um barco naufraga num domingo, elas dizem: “Isso é o juízo de Deus”. No
entanto, igrejas e templos pegam fogo e missionários se afogam quando estão a
serviço do próprio Senhor. É um erro dizer que tudo o que acontece é juízo de
Deus, pois assim cairemos no erro dos amigos de Jó, e estaremos condenando o
inocente. O fato é que há poucos atos da providência divina dirigidos a pessoas
que podem ser declarados, com certeza, como julgamento. É claro que eles
existem, mas são incrivelmente raros nesta vida, considerando a maneira pela
qual Deus é frequentemente provocado pela arrogância e pela blasfêmia. Foi um
ato de julgamento quando o exército de Faraó se afogou no Mar Vermelho; foi um
ato de julgamento quando Coré, Datã e Abirão foram tragados vivos pelo abismo.
Mais tarde, houve julgamentos na igreja de Deus quando Ananias e Safira caíram
mortos por terem mentido ao Espírito Santo; e quando Elimas, o mágico, ficou
cego por se opor a Paulo. Mesmo assim, os casos são poucos e, tempos depois,
instâncias autênticas são igualmente raras. Não é o próprio Senhor que diz que
julgamento é “sua obra estranha”? (Isaías 28.21). Para o Seu próprio povo há
constante julgamento de disciplina paterna, mas para o mundo exterior o que
prevalece é o bondoso regime da misericórdia. Esta é a era da paciência e da
longanimidade. Se Deus tivesse algum prazer na morte do perverso, alguns aqui
já estariam no inferno há muito tempo. No entanto, Ele não os trata de acordo
com seus pecados, nem os recompensa de acordo com suas iniquidades. Se Deus
sempre julgasse a mentira, quantos aqui presentes já não teriam recebido sua
porção no lago de fogo! Se sempre houvesse julgamento pela violação do dia de
descanso, Londres já teria sido destruída tal qual Sodoma e Gomorra. Contudo,
Deus reserva Sua ira para o dia da ira, pois, por enquanto, Ele faz vista
grossa à obstinação humana, pois este não é o lugar do julgamento, mas da
tolerância e da esperança. A escassez de obras de julgamento sobre os ímpios
nesta vida prova que Deus não tem prazer nelas.
Em segundo lugar, a duração da
longanimidade de Deus antes do Dia do Juízo prova que Ele não deseja a morte de
ninguém. O Senhor poupa muitos culpados por setenta anos, tolerando seus maus
costumes, a fim de estimular sua gratidão. As loucuras da juventude são
sucedidas pelos erros deliberados da idade adulta, e estes, pela teimosia da
maturidade; mesmo assim, o Senhor continua sendo paciente! Algumas pessoas
rejeitam a Cristo depois de terem ouvido o evangelho durante vários anos,
reprimindo sua consciência que clama contra elas, e fazem isso a despeito do
Espírito de Deus. Rebelam-se contra a luz e cometem pecados cada vez maiores,
mas Deus não as destrói. Se Ele encontrasse prazer na morte, será que toleraria
que vivessem por tanto tempo? Tais pessoas ocupam inutilmente a terra (cf. Lc
13.7), não por dois ou três anos como a figueira estéril, mas deixam de dar
fruto na videira de Deus por quarenta ou sessenta anos; no entanto, Ele
continua poupando-as! Alguns vão ainda além, pois provocam a Deus com sua
incredulidade descarada, com palavras abomináveis contra o próprio Deus, contra
o Seu Filho e contra o Seu povo. Tentam enfiar o dedo nos olhos de Deus, cuspir
no rosto do Amado e persegui-lo na pessoa do Seu povo. Contudo, o Senhor não dá
cabo deles de imediato, como seria justo fazer. Será que tais pessoas não ouvem
a espada do Senhor se agitando em sua bainha? Ela já teria saltado, se a
misericórdia não a tivesse empurrado de volta, implorando: “Ah! Espada do
Senhor... descansa e aquieta-te!” (Jeremias 47.6). É só porque Sua compaixão
nunca falha que vocês são favorecidos com os ternos convites do evangelho.
Somente devido à Sua infinita paciência, a graça ainda luta contra o pecado
humano e a incredulidade. Vamos, então, cada um clamar ―
Senhor, ainda tenho vida
Não no inferno, nem em desdita!
Teu bom Espírito comigo
lida ―
Com o maior pecador habita?
Diga aos pecadores, diga sim
Que estou
fora do inferno enfim!
Além do mais, lembrem-se da
perfeição do caráter de Deus como Regente moral do Universo. Ele é o Juiz de
tudo, e deve fazer o que é certo. Ora, se um juiz em sua tribuna fosse
conhecido por ter prazer em punir criminosos, ele deveria ser afastado do
cargo, pois ficaria claro que ele seria totalmente inadequado para o exercício
de sua função. Quem tem prazer em mandar alguém para a forca ou para a prisão é
da mesma laia que o Juiz JeffreysNT2 e outros
monstros do tipo, os quais, estou certo, foram expurgados definitivamente de
nossos tribunais. No entanto, se eu soubesse que um juiz nunca deu uma sentença
de morte sem lágrimas nos olhos, que, quando vai para casa depois do trabalho,
fica pensando nas pessoas que foram banidas da sociedade para sempre por causa
de suas sentenças, que fica triste e infeliz a toda a noite, eu diria: “Sim,
esse é o tipo de pessoa que deve ser juiz”. Em um juiz, aversão à punição é
necessária à justiça. Deus é assim; Ele não tem prazer no pecado, nem na
punição decorrente do pecado; Ele odeia tanto um quanto o outro, e só chega às
vias de fato quando tudo o mais falha. Quando o pecador precisa ser condenado,
para que a sociedade não saia dos trilhos, só então Ele profere a terrível
sentença. No entanto, ainda assim é com genuína relutância, pois Ele diz: “Como
posso desistir de ti”? No texto, parece que o Grande Juiz de todas as coisas
desce da glória da Sua tribuna e mostra Sua face, dizendo: “Julguei, condenei e
castiguei, mas, tão certo como vivo, não tenho prazer em tudo isso, meu prazer
está nas pessoas que se voltam para mim e vivem”.
Se qualquer outro pensamento fosse
necessário para corrigir a desconfiança de vocês, eu poderia mencionar a
graciosidade da obra do Senhor em salvar aqueles que deixam seus maus caminhos.
O cuidado com que o Altíssimo conduz ao arrependimento, a boa vontade com que
Ele aceita o arrependido e o amor abundante manifestado aos pródigos que
retornam são evidências inquestionáveis de que Deus não tem prazer na morte do
perverso, e sim na sua salvação. Para impedir a morte do perverso, o Senhor
concebeu um plano de salvação antes da fundação do mundo, e aqueles que aceitam
esse plano descobrem que o Senhor proveu um Substituto para eles, na pessoa de
Seu Filho amado, O qual, na verdade, é Ele mesmo, e que na Sua própria pessoa
Deus suportou a pena devida ao pecado; e que, dessa forma, a lei foi
solenemente cumprida e a justiça divina satisfeita. O Senhor foi pendurado no
madeiro e ali deu Sua vida, para que Ele mesmo seja justo e justificador
daquele que tem fé em Jesus (Romanos 3.26): acaso isso não prova o Seu deleite
na salvação? O Espírito Santo vem com o propósito de renovar o coração e
retirar dele a dureza, a fim de que as pessoas se tornem ternas e penitentes ―
porventura isso não prova Seu prazer em salvar? Todos os recursos emanam
espontaneamente da Divindade para a salvação daqueles que abandonam seus
pecados. Sim, tais recursos saem antes que as pessoas se convertam, a fim de
que elas sejam dissuadidas e transformadas. Deus é encontrado até mesmo por
aqueles que não O buscam, Ele dispensa Sua graça antes que clamem a Ele, não
depois. Como se Deus Se tivesse ficado indignado com a acusação de que Ele tem
prazer na morte de alguém, Ele preferiu Ele mesmo morrer no madeiro a deixar um
mundo de pecadores sucumbir no inferno. Para provar Seu desejo de que os homens
vivam, Seu filho habitou por mais de trinta anos neste mundo indigno como homem
entre os homens, e Seu Santo Espírito tem habitado neles por todos estes
séculos, suportando todas as provocações de um povo ingrato e sem entendimento.
Deus demonstra de várias maneiras que não é o Destruidor, e sim o Preservador
da humanidade. “O nosso Deus é o Deus libertador” (Salmo 68:20). “Do Senhor é a
salvação” (Salmo 3.8).
Assim sendo, tentarei demonstrar os
caminhos de Deus para o homem. Quando alguém é levado a julgamento, seus
amigos, se puderem, vão até a prisão e dizem: “Olha, quem vai presidir o
julgamento não é o Juiz Fulano de Tal, que não dá moleza; você vai ser julgado
pela pessoa mais bondosa do tribunal”. Muitos prisioneiros se enchem de coragem
com uma notícia dessas. Ah, pobre pecador, você que não quer acreditar em Deus,
deixe-me dar-lhe esta esperança, lembrando-o de que é o Amor encarnado quem
está no tribunal; Ele é quem deve e quem vai condená-lo, a menos que você
abandone seus pecados, embora Ele não sinta prazer nessa condenação, nem esteja
disposto a mostrar o machado da execuçãoNT4. Por que não se converte a Ele e vive? Será que as
misericórdias do Senhor (Lm 3.22) não o convidam a se render completamente a
Ele e achar graça aos Seus olhos?
2. Agora, em segundo lugar, DEUS
NÃO TEM ALTERNATIVA, SENÃO QUE O HOMEM SE CONVERTA DO SEUS MAUS CAMINHOS OU
MORRA. “Não tenho prazer na morte do perverso, mas em que o perverso se
converta do seu caminho e viva”. É uma coisa ou outra: conversão ou
perdição. Deus, com todo o Seu amor pelo homem, não pode dar alternativa: o
homem não pode continuar em seus pecados e, ainda assim, ser salvo. O pecado
precisa morrer ou quem morre é o pecador.
Portanto, a primeira coisa a saber é
que, quando Deus proclama Sua misericórdia ao homem sob essa condição ― que o
homem deve se converter dos seus maus caminhos, isso decorre única e
exclusivamente da Sua graça. Por uma simples questão de direito, o
arrependimento não traz consigo a misericórdia. Acaso um assassino é perdoado
só porque se arrepende do que fez? Porventura um ladrão escapa da prisão só
porque, no final, lamenta não ter sido honesto? O arrependimento não repara o
mal que foi feito; o dano permanece, e o castigo precisa ser aplicado. Assim
sendo, é a graça que me permite dizer: “Convertei-vos, convertei-vos dos vossos
maus caminhos”. É porque, por detrás do arrependimento existe um grande
sacrifício; é por meio de um sacrifício totalmente suficiente que ele se torna
aceitável. O Filho de Deus derramou Seu sangue na cruz e morreu, fazendo
expiação pelo pecado; agora Ele é exaltado nas alturas, para dar arrependimento
e remissão de pecados. Hoje, a palavra de Deus é: “Arrependei-vos e crede no
evangelho” (Mc 1.15). “Se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo
para nos perdoar os pecados e nos purificar de toda injustiça” (1 João
1:9). Isso não é segundo a lei, que não
dá espaço para o arrependimento, é uma questão puramente da graça. Deus nos
salva não devido a qualquer mérito da nossa parte, mas porque Ele tem
misericórdia de quem quer (Romanos 9.18) e decretou salvar a todos quantos se
desviam dos caminhos do mal.
A seguir, observem que, se não
houver arrependimento, deve haver punição, pois qualquer outra teoria seria o
fim do governo moral. A pior coisa que poderia acontecer à humanidade seria
Deus dizer: “Retiro a minha lei; não recompensarei a virtude, nem punirei a
iniquidade; façam o que quiserem”. Isso seria realmente o inferno na terra. O
maior inimigo do governo civil entre os homens é aquele que prega a salvação
universal ― a salvação sem mudança do coração e da vida. Tais professores são
um perigo para a ordem nacional, pois removem os alicerces da comunidade. É
quase como se dissessem: “Façam como quiserem; pode ser que, durante algum tempo,
haja uma pequena diferença, mas logo passará, e mocinhos e bandidos dividirão o
céu do mesmo jeito”. Esse tipo de conversa é detestável! Não posso dizer menos
que isso. Para que haja governo, não pode haver impunidade; ser complacente com
o desonesto é ser cruel com o prejudicado. Salvar o assassino é matar o
inocente. Seria uma catástrofe para o céu e a terra se pudesse ser provado que
Deus poderia recompensar justos e injustos da mesma forma: os alicerces seriam
removidos, e os justos o que fariam? (Salmo 11.3). Um Deus que não é quem
deveria ser seria um pobre Governante do universo.
Sim, meus ouvintes, o pecado precisa
ser punido; ou você o abandona ou morre, pois o pecado é o seu próprio castigo.
Quando falamos sobre o fogo que nunca se apaga e sobre o verme que nunca morre,
supõe-se que estejamos falando de coisas literais, mas, na verdade, são
figuras, figuras que representam algo muito mais terrível que elas mesmas: o
fogo são as chamas da furiosa rebelião da alma e o verme é a tortura de uma
consciência que nunca morre. Pecado é o inferno. Nas entranhas da desobediência
existe um mundo de miséria. Deus nos constituiu de tal forma, e com razão, que
não podemos mais ser perversos e felizes ao mesmo tempo; quando erramos,
acabamos nos sentindo miseráveis; e, quanto mais errados estivermos, e mais
continuarmos no erro, com mais certeza estaremos acumulando tristezas por nós
mesmos pela eternidade afora. Santidade e justiça produzem felicidade, mas
iniquidade e engano devem, por necessidade de uma natureza que não pode ser
mudada, produzir tribulação e angústia. É assim que deve ser. Mesmo a
onipotência de Deus não pode fazer feliz um pecador impenitente. Você precisa
abandonar o pecado ou se tornará miserável; você precisa renunciar ao pecado ou
renunciará à toda esperança de uma eternidade feliz. Você não pode se casar com
Cristo e o céu enquanto não se divorciar do pecado e de si mesmo.
Quando a consciência de alguém é
totalmente honesta, creio que ela dá testemunho disso. Mas existem algumas
consciências bem curiosas ― tão distorcidas que, de forma alguma, são
consciências de verdade. Vejo pessoas agindo deliberadamente de má-fé, mas
falando sobre verdade e santidade. No entanto, quando a consciência não está
embriagada com o vinho misto da soberba e da incredulidade dirá que, quando se
faz o mal, não se pode esperar receber aprovação; e, quando se deixa de fazer o
bem, não se pode esperar receber a mesma recompensa de quando se faz ― que, de
fato, deve haver, na natureza das coisas, uma punição atrelada ao crime. A
consciência fala, e agora é o próprio Deus, que não tem prazer na morte do
perverso, que diz ― você precisa se arrepender, ou vai morrer. Se continuar nos
seus maus caminhos, estará perdido. É preciso abandonar o pecado, ou o Deus
Altíssimo nunca poderá olhá-lo com favor. Estão me ouvindo? Que isso penetre
profundamente em seu coração e produza arrependimento!
3. Isso me leva ao terceiro
ponto, o qual é maravilhoso: DEUS TEM PRAZER NO HOMEM QUE ABANDONA O SEU
PECADO. Leia de novo a passagem: “Dize-lhes: Tão certo como eu vivo, diz o
Senhor Deus, não tenho prazer na morte do perverso, mas em que o perverso se
converta do seu caminho e viva”. Dentre as maiores alegrias divinas está o
prazer de ver um pecador se afastar do mal. Deus Se deleita nas primeiras vezes
em que as pessoas começam a pensar nEle e começam a meditar nos Seus caminhos e
a considerar a sua própria condição diante dEle, quando até então nem se
importavam com isso. Ele vê com prazer aqueles que outrora foram rebeldes e
insensatos, mas que, finalmente, começam a pensar na eternidade e a avaliar o
futuro de pecado e juízo. Quando você ouve o convite: “Buscai o Senhor enquanto
se pode achar, invocai-o enquanto está perto” (Isaías 55:6), Deus tem prazer em
observar sua atenção. Quando você começa a se aperceber da sua situação e diz:
“Sinto tanto pelo meu pecado; quisera nunca tê-lo cometido!”, Ele ouve o seu
suspiro. Quando o seu coração está cansado de pecar, quando você detesta o mal
e sente que, embora não consiga se afastar dele, se pudesse o faria, então Ele
olha para você com olhar compassivo. Quando, por Sua graça, existe uma vontade
renovada brotando no seu coração ― vontade de crer e obedecer, então o Pai
também sorri. Quando Ele ouve o seu interior, gemendo e ansiando pela casa e
pelo seio do Pai, você não pode vê-lO, mas Ele está escutando você atrás da
porta. Sua mão está secretamente recolhendo suas lágrimas em Seu odre (Salmo
56.8) e Seu coração está cheio de compaixão por você. “Agrada-se o Senhor dos
que o temem e dos que esperam na sua misericórdia” (Salmos 147:11). Observe
ainda esta última característica: a pessoa só tem um pouquinho de esperança,
mas mesmo assim o Senhor tem prazer nela. Mesmo que a boa obra ocorra apenas no
entardecer, Deus tem tanto prazer nela quanto um sentinela se alegra com os
primeiros raios da manhã; sim, Ele fica mais feliz do que aqueles que esperam o
amanhecer. E, quando você finalmente começa a orar, clamando: “Ó Deus, sê
propício a mim, pecador!” (Lucas 18:13), Ele também tem prazer, pois vê sinais
claros de que você está caindo em si e indo para Ele. Seu Espírito diz: “Veja,
ele está orando”, e Ele toma isso como um sinal permanente. Quando você
abandona sinceramente o pecado, Deus o vê fazendo isso e fica tão feliz que os
santos anjos contemplam a Sua alegria.
Tenho certeza de que Deus vê as
lutas daqueles que se esforçam para fugir dos velhos hábitos e dos maus
caminhos. Quando tentam subjugar os maus pensamentos; quando, à noite,
sentam-se e lamentam as falhas que tiveram ao longo do dia por não terem ido
tão bem quanto esperavam, o Senhor observa os seus desejos e lamentos. Do mesmo
modo que uma mãe observa com ternura seus filhos quando começam a andar, e
sorri quando eles vão vacilantes de uma cadeira para outra, estendendo a mão
para ajudá-los, Deus também tem prazer nas nossas primeiras tentativas de
sermos santos, nos nossos desejos de vencer o pecado, nos nossos suspiros e
clamores para sermos libertos do cativeiro da corrupção. Ele disse: “Todavia,
eu ensinei a andar a Efraim; tomei-os nos meus braços” (Oséias 11:3), e da
mesma maneira Ele está nos ensinando.
Vou lhes contar que o que mais
agrada a Deus é quando alguém recebe Seu Filho amado e fala: “Senhor, algo me
diz que não há esperança para mim, mas não acredito nessa voz. Li na Tua
Palavra que não lançarás fora quem se achegar a Ti, e eis que eu me achego! Sou
o maior dos pecadores, mas, Senhor, creio na Tua promessa; sou tão indigno
quanto o próprio diabo, mas Tu, Senhor, não pedes dignidade, somente fé como a
de uma criança. Não me lances fora ― eu descanso em Ti”. “Sem fé é impossível
agradar a Deus” (Hb 11.6), mas Deus sente um prazer divino ao ver o primeiro
grãozinho de fé no coração do pobre pecador transformado. Gostaria tanto que
pensassem nisso, todos vocês que continuam se autocondenando! Quando recebo
suas cartas cheias de autocondenação, isso me agrada; e, se agrada, tenho
certeza de que agrada muito mais a Deus, pois Ele é infinitamente mais terno
que eu, embora eu tente humildemente imitá-lO. Ah, como gostaria de poder
fazê-los confiar no meu Senhor e acabar com seus medos e dúvidas cruéis!
Dúvidas e raciocínios falazes
estão
Pregados
na cruz desde então
O
argumento mais convincente de Deus é a morte sangrenta de Seu Filho na cruz.
Ah, grande pecador, converta-se ao Senhor e Ele terá prazer na sua conversão!
Sabia que todos os seus pensamentos sobre Ele são soprados pelo Seu Espírito?
Todos os pesares pelo pecado, todos os desejos de santidade e, especialmente,
toda confiança em Cristo e toda a esperança na Sua misericórdia, tudo isso é
obra do Espírito Santo: todas essas coisas nunca seriam encontradas na sua alma
se Ele não as tivesse colocado lá. Se vir uma linda flor crescendo num monte do
esterco, concluo que um jardineiro esteve por lá e lançou ali uma semente. E,
quando vejo uma alma começando a orar, a ter esperança e crer, digo a mim
mesmo: “Deus está lá. O Espírito Santo está em ação, ou não haveria a menor
confiança, nem a mais leve esperança”. Portanto, tenha coragem, você está se
aproximando de um Deus cheio de graça e favor.
Durante a sua vida, quando continuar
na luta contra o pecado e se consagrar a Jesus, quando lavar os pés do Salvador
com suas lágrimas e enxugá-los com seus cabelos como Maria Madalena, ou quando
quebrar o vaso de alabastro e derramar seu bálsamo precioso na cabeça do Mestre
como Maria, o Senhor terá grande prazer em você por amor a Jesus. Ele não tem
prazer em gemidos e gritos do inferno, mas Se alegra no arrependimento dos
pecadores. O fogo do inferno não Lhe dá satisfação alguma, mas pecadores
penitentes batendo no peito e crentes contemplando Cristo com olhos cheios de
lágrimas são um espetáculo majestoso para Ele. É assim, Ele jura, então é
verdade. Pare de fugir e creia na vida eterna.
4. Finalmente, uma vez que Ele
tem prazer em que o homem se converta a Ele, DEUS O EXORTA A FAZER ISSO, E
ACRESCENTA UMA RAZÃO. “Convertei-vos, convertei-vos dos vossos maus caminhos;
pois por que haveis de morrer, ó casa de Israel?”. Deus percebe sua pobre
criatura dando-Lhe as costas, olhando para os ídolos, olhando para os prazeres
pecaminosos, olhando para a cidade da destruição, e o que Ele diz? Ele diz:
“Converta-se!” A direção é muito clara, não é? “Converta-se”, ou “siga na
direção certa!”. Isso é tudo. Mas alguém diz: “Pensei que deveria sentir muita
angústia e agonia”. Não vou estranhar se você sentir isso, mas tudo o que Deus
diz é: “Converta-se”. Agora você está indo na direção errada; “converta-se” e
vá na direção certa. Essa conversão é o verdadeiro arrependimento. Mudança de
vida é a essência do arrependimento, e ela precisa brotar de um coração
transformado, de um desejo transformado, de uma vontade transformada. Deus
disse: “Convertei-vos!” Oh, que vocês ouçam e obedeçam!
Observem que Ele coloca a frase no
presente ― “Convertei-vos”; não amanhã, mas agora. Ninguém será salvo amanhã:
todos aqueles que são salvos, são salvos hoje. “Eis, agora, o tempo sobremodo
oportuno” (2Co 6.2). “Convertei-vos”. Que pela infinita misericórdia de Deus, O
qual permitirá que vocês se convertam, oro para que vocês se convertam dos seus
maus caminhos, da sua autoconfiança, e se voltem para Ele. Não é uma conversão
qualquer, mas uma conversão para Deus. Se o Senhor o converter, converta-se a
Ele, e confie somente nEle, para servi-lO e para temê-lO.
“Convertei-vos, convertei-vos”.
Vejam, o Senhor fala duas vezes. Essas repetições querem dizer que Ele quer o
seu bem. Suponham que eu visse um empregado meu atravessando um rio e percebesse
que logo não daria mais pé para ele, e assim, estaria em grande perigo;
suponham que eu gritasse para ele: “Pare! Pare! Se der mais um passo, vai se
afogar. Volte! Volte!” Será que alguém se atreveria a dizer: “Pastor, ficaria
contente se ele se afogasse”? Seria cruel demais. Quem insinua uma coisa
dessas, quando estou pedindo a meu empregado que volte e salve sua vida, só
pode ser um grande mentiroso! Acaso Deus diria para escaparmos da morte se Ele
realmente não desejasse isso? Creio que não. Todo pecador pode ter certeza de
que Deus não sente prazer na sua morte quando insta com ele com estas palavras
incomparáveis: “Convertei-vos, convertei-vos dos vossos maus caminhos; pois por
que haveis de morrer”? Nestas palavras ― “Convertei-vos, convertei-vos” ― há o
que os antigos teólogos chamavam de reiteração, um gemido interno, uma
duplicação da súplica. A cada súplica, Deus é mais enfático. Será que vocês vão
ouvir?
E, então, Ele conclui pedindo aos
homens que encontrem uma razão pela qual devam morrer. Deve haver uma boa razão
para alguém desejar a morte. “Por que haveis de morrer”? Esta é uma pergunta
sem resposta, com relação à morte eterna. Será que existe alguma coisa
desejável em ficar eternamente afastado da presença do Senhor e da glória do Seu
poder? Haveria algum ganho em perder a própria alma? Haveria algum benefício em
ir para o castigo eterno? Haveria algo desejável e almejável em ser lançado no
inferno, onde o verme nunca morre e o fogo nunca se apaga? Ó, almas, não sejam
irracionais! Não negligenciem tão grande salvação! Deve ser a pior coisa do
mundo morrer nos próprios pecados; por que escolheriam isso? Querem naufragar?
Por que navegar perto da costa rochosa e brincar com fogo? Vocês comeriam os
doces envenenados do pecado só porque são adoçados com um pouquinho de prazer
do presente? No final, o fel de amargura encherá suas entranhas. Não sou
bajulador: não me atrevo a ser, pois eu os amo e gostaria de persuadi-los a se
converterem ao Senhor. Há uma flor que sempre se volta para o sol; tomara vocês
se voltem da mesma forma para Deus! Por que dar as costas a Ele? “POR QUÊ?” é
apenas uma palavrinha, mas quanto é preciso para atender às suas exigências!
POR QUE continuar no pecado? Por que não crer no Salvador? Por que provocar a
Deus? POR QUE morrer? Dê a volta e diga: “Ó, Senhor, não posso suportar a ideia
da morte eterna, por isso, não posso continuar a viver em pecado. Que a Tua
imensa graça me ajude”!
Oxalá vocês creiam no Senhor Jesus!
Descansem nEle e na Sua obra consumada, e tudo irá bem. Será que ouvi alguém
dizer: “Vou orar por isso”? É melhor crer de uma vez por todas. Depois disso,
ore o quanto quiser. O que há de bom nas orações incrédulas? “Depois do culto
vou conversar com alguém consagrado”. Creia primeiro em Jesus. Vá para casa
sozinho, crendo em Cristo. “Gostaria de ir à sala de decisãoNT3”. Ouso dizer que deveria, mas não estamos
dispostos a ceder à superstição popular. Receio que em tais salas as pessoas
fiquem empolgadas com uma convicção fictícia. Pouquíssimos supostos convertidos
das salas de decisão se saem bem. Volte-se para Deus de uma vez por todas,
esteja onde estiver. Lance-se sobre Cristo já, de uma vez, antes de dar mais um
passo! Em nome do Senhor eu lhe digo: creia no Senhor Jesus Cristo, pois “Quem
crer e for batizado será salvo; quem, porém, não crer será condenado” (Marcos
16:16)
Tradução
e revisão: Mariza Regina de Souza
NT1 — A Peste Negra, uma pandemia de peste bubônica que atingiu a Europa em 1347, se espalhou para a Inglaterra em 1348, matando entre um terço e metade dos habitantes do país. (fonte: http://molhoingles.com/a-peste-negra-na-inglaterra/)
NT2 — George Jeffreys (1645-1689), juiz inglês notório por sua crueldade e corrupção (https://www.britannica.com/biography/George-Jeffreys-1st-Baron-Jeffreys-of-Wem)
NT3 — Numa tradução livre, “sala da decisão”, sala onde eram feitas perguntas para que a pessoa pudesse “se decidir por Cristo”. v. Spurgeon: Prince of Preachers, Lewis A. Drummond, p. 309, Kregel Publications, Grand Rapids,1992, MI 49501.
NT4 — machado que era usado para decapitar condenados à morte
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