Sermão nº 1307
Sermão pregado na manhã de
domingo do dia 30 de julho de 1876
por Charles Haddon Spurgeon
no Tabernáculo Metropolitano,
Newington, Londres, Inglaterra
“Enoque viveu sessenta e
cinco anos e gerou a Metusalém. Andou Enoque com Deus; e, depois que gerou a
Metusalém, viveu trezentos anos; e teve filhos e filhas. Todos os dias de
Enoque foram trezentos e sessenta e cinco anos. Andou Enoque com Deus e já não
era, porque Deus o tomou para si.” Gênesis 5:21-24
“Pela fé, Enoque foi
trasladado para não ver a morte; não foi achado, porque Deus o trasladara.
Pois, antes da sua trasladação, obteve testemunho de haver agradado a Deus. De
fato, sem fé é impossível agradar a Deus, porquanto é necessário que aquele que
se aproxima de Deus creia que ele existe e que se torna galardoador dos que o
buscam.” Hebreus 11:5-6
“Quanto a estes foi que
também profetizou Enoque, o sétimo depois de Adão, dizendo: Eis que veio o
Senhor entre suas santas miríades, para exercer juízo contra todos e para fazer
convictos todos os ímpios, acerca de todas as obras ímpias que impiamente
praticaram e acerca de todas as palavras insolentes que ímpios pecadores
proferiram contra ele.” Judas 1:14-15
TODA
informação verdadeira que temos sobre Enoque está nas três passagens das
Escrituras que li. Seria perda de tempo completá-las com fantasias de antigos
comentaristas. Enoque é chamado de o sétimo depois de Adão para distingui-lo do
outro Enoque, da linhagem de Caim, o qual foi o terceiro depois de Adão. Nos primeiros patriarcas, Deus quis
manifestar aos homens pequenas porções da Sua verdade com relação à verdadeira
religião. Esses homens dos tempos antigos não só foram, eles mesmos, ensinados
por Deus, como também se tornaram professores da sua geração e tipos nos quais
grandes verdades de Deus foram mostradas. Abel ensinou a necessidade de se
chegar ao Senhor com sacrifício, a necessidade da expiação pelo sangue — ele
colocou o cordeiro sobre o altar e selou seu testemunho com o próprio sangue. A
expiação é uma verdade de Deus tão preciosa que é uma honra morrer em sua
defesa e, desde o princípio, é uma doutrina que tem garantido seus mártires, os
quais, mesmo mortos, ainda falam.
Em
seguida, Sete e Enos ensinaram aos homens a necessidade de uma confissão
particular da sua fé no Senhor e a necessidade de se congregar para a adoração,
pois lemos acerca dos seus dias: “daí se começou a invocar o nome do SENHOR”
(Gn. 4:26). Aqueles que adoravam a Deus por meio sacrifício expiatório
separavam a si mesmos dos outros homens, reuniam-se na igreja em nome do Senhor
e cultuavam invocando o nome de Deus. O coração deve, em primeiro lugar, crer no
grande sacrifício com Abel, e depois, com a boca, confessar da mesma forma que
Sete. Então veio Enoque, cuja vida foi além da aceitação e confissão da
expiação, pois ele mostrou aos homens a verdadeira comunhão com Deus. Ele
exibiu na sua vida o relacionamento entre o crente e o Altíssimo e demonstrou
quão perto o Deus vivo consente estar dos Seus próprios filhos. Que o nosso
avanço no conhecimento seja semelhante ao crescimento do ensino patriarcal!
Irmãos
e irmãs, vocês sabem como fez Abel, o cordeiro sacrificial. Sua confiança está
no sangue precioso de Jesus e, por isso, pela fé, vocês oferecem a Deus ofertas
aceitáveis. Tendo chegado até aqui, a maioria de nós dá um passo além,
invocando o nome do Senhor, professando seguir os passos de Jesus. Renunciamos
a nós mesmos no sepultamento solene do batismo, quando somos batizados em nome
do Pai, do Filho e do Espírito Santo, pois nos consideramos mortos em Cristo
para o mundo e ressuscitados com Ele em novidade de vida. Daí em diante o nome
divino está em nós e não somos mais de nós mesmos. E agora nos reunimos como
igreja. Sentamos à mesa da comunhão, participamos das reuniões de oração e dos
cultos, e no centro de tudo está o nome do Senhor. Somos separamos do mundo e
escolhidos para ser o povo que declara o Seu nome. Até aqui tudo bem — vimos o
sacrifício de Jesus tipificado em Abel. Professamos a verdade com Sete. Agora,
vamos dar o passo seguinte e conhecer
a vida com Enoque. Vamos nos esforçar para andar com Deus como ele andou!
Talvez a meditação sobre a vida santa do patriarca nos ajude a imitá-lo.
Enquanto consideramos o que ele foi e em quais circunstâncias ele veio a ser
assim, que o Espírito Santo nos ajude a chegar aonde ele chegou.
Esse
é o desejo de todo homem temente a Deus! Todos os santos querem ter comunhão
com o Pai e com Seu Filho Jesus Cristo. O clamor constante da nossa alma ao
Senhor é: “fica, pois, comigo”. Ontem fiz o sepultamento de uma das pessoas
mais excelentes da terra, a qual amava e temia e servia a Deus muito melhor que
a maioria de nós. Ele era um irmão muito consagrado. Quando ainda nem pensava
em morrer, ele fez questão de colocar um dos últimos desejos do seu coração em
uma carta escrita para um amigo. O desejo era: “quero ter a vida de Enoque e
andar com Deus” —
“Oh, mais perto de Deus quero andar!”
Na verdade, ele escreveu
aquilo que nós sentimos. Se forem esses os nossos desejos, e tenho certeza de
que são, assim como somos povo do Senhor, então espero que a meditação na vida
de Enoque possa nos ajudar a realizar esse desejo.
Em
primeiro lugar, então, no que implica o
andar de Enoque com Deus? A descrição é bem curta para a vida de um homem,
mas há muito significado nela. Em segundo lugar, quais as circunstâncias ligadas à sua vida extraordinária? São
muito instrutivas. E em terceiro lugar, qual
foi o seu fim? Foi tão extraordinário quanto a sua própria vida.
1.
Assim, passamos ao primeiro ponto: O QUE
SIGNIFICA O ANDAR DE ENOQUE COM DEUS? Paulo (NT: Spurgeon acreditava que
Paulo era o autor da carta aos Hebreus) nos ajuda em nossa primeira observação
com seu comentário em Hebreus. O andar de Enoque com Deus era um testemunho de
que ele agradava a Deus. “Antes da
sua trasladação, obteve testemunho de haver agradado a Deus”. Essa é uma
interpretação clara do apóstolo sobre o andar de Enoque com Deus e com certeza
é a correta, pois o Senhor não andaria com alguém em quem não sentisse prazer.
“Andarão dois juntos, se não houver entre eles acordo?” (Amós 3:3). Se os
homens andam de forma contrária a Deus, ele não andará com eles, mas contra eles. Andar junto implica amizade, camaradagem,
intimidade, amor — e essas coisas não podem existir entre Deus e a alma, a
menos que a pessoa seja aceitável ao Senhor.
Enoque, sem dúvida, como Elias, era um homem de paixões como
nós. Ele caíra, com os demais seres humanos, no pecado de Adão. Havia pecado
sobre ele, como há em nós pela nossa natureza, e ele havia se extraviado em
atos e obras como todos nós, como ovelhas, nos extraviamos. Portanto, ele
precisava de perdão e purificação, assim como nós precisamos. Depois, para ser
agradável a Deus, era necessário ele ser perdoado e justificado, assim como nós
— pois ninguém pode agradar a Deus até seu pecado ser perdoado e a justiça
ser-lhe imputada. Para isso, é
necessário ter fé, pois não há justificação senão pela fé. E como
dissemos, não há como agradar a Deus sem a pessoa ser justificada.
Muito
bem, então o apóstolo diz: “sem fé é impossível agradar a Deus”, e pela fé
Enoque se tornou agradável a Deus, assim como nós nos dias de hoje. Isso merece
uma observação muito séria, irmãos e irmãs, pois esse tipo de fé está aberto a nós. Se Enoque tivesse sido agradável a
Deus em virtude de dons e talentos extraordinários, ou por ter realizado coisas
maravilhosas e miraculosas, estaríamos perdidos! Mas se ele foi agradável a
Deus por meio da fé, a mesma fé que
salvou o ladrão da cruz, a mesma fé que tem operado em vocês e em mim — então o
portão de entrada para o caminho por onde os homens andam com Deus está aberto
a nós, também!
Se
temos fé, podemos ter comunhão com o Senhor! Como isso deve valorizá-la para
nós! Os níveis mais altos da vida espiritual dependem dos mais baixos e
procedem deles. Se você quer andar com Deus como um homem de Deus, deve começar
simplesmente crendo no Senhor Jesus Cristo, como um bebê na graça! A santidade
mais elevada deve começar pela confissão da nossa pecaminosidade, e pela nossa dependência no Cristo crucificado. De
outra forma, o crente mais forte não vive mais do que o mais fraco — e se é
preciso crescer para estar entre os guerreiros mais fortes do Senhor — é
preciso que seja pela fé depositada na força divina.
Começando
no Espírito, você não deve se aperfeiçoar na carne. Você não deve continuar à distância, com fé em Cristo, e
começar a viver por suas próprias obras — sua caminhada deve continuar como
começou. “Ora, como recebestes Cristo Jesus, o Senhor, assim andai nele” (Cl.
2:6). Enoque sempre foi agradável a Deus, mas porque ele sempre creu e viveu no
poder da sua fé. Vale a pena saber e lembrar disso, pois talvez ainda sejamos
tentados a lutar por um estilo mais elevado e fantasioso de vida religiosa,
olhando para os nossos sentimentos ao
invés de olhar somente para o Senhor! Não podemos deixar de olhar somente para Jesus, para Ele mesmo, nem
mesmo para admirar a Sua imagem dentro de nós — pois, se o fizermos, iremos
retroceder ao invés de avançar. Não, amados, pela fé Enoque se tornou agradável
a Deus e pela fé ele andou com Deus — sigamos suas pegadas.
A
seguir, quando lemos que Enoque andava com Deus, devemos entender que ele sentia a presença divina. Não se
pode conscientemente andar com uma pessoa cuja existência lhe é desconhecida.
Quando andamos com alguém, sabemos que a pessoa está ali. Ouvimos seus passos
se não podemos ver seu rosto. Temos uma percepção clara de que ela está ao
nosso lado. Ora, se olharmos novamente para Hebreus, Paulo nos diz: “porquanto
é necessário que aquele que se aproxima de Deus creia que ele existe e que se
torna galardoador dos que o buscam”. A fé de Enoque, então, era uma fé palpável. Ele não acreditava nas
coisas só por acreditar e depois as colocava numa prateleira fora do caminho,
como muito de nós fazemos — ele não tinha simplesmente uma mente ortodoxa — a
verdade de Deus tinha penetrado no seu coração.
Sua
fé era real para ele, real de fato, real como algo comum na sua vida diária.
Ele andava com Deus — não era que ele simplesmente pensava em Deus, ou especulava
sobre Deus, ou debatia sobre Deus, ou
lia sobre Deus, ou falava sobre Deus — ele andava com Deus, que é a parte prática e
vivencial da verdadeira santidade! Em sua vida diária, ele tinha consciência de
que Deus estava com ele e ele O considerava como um Deus vivo, aquele em quem
confiava e por quem era amado. Oh, amados, não percebem que para alcançar um
patamar mais elevado na vida cristã é preciso fazê-lo por meio da concretização
das mesmas coisas que, pela fé, vocês receberam? Compreendam-nas! Permitam que
elas façam parte de vocês e se comprovem em vocês. Tenham certeza delas,
meditem nelas, lidem com elas, provem-nas no mais íntimo da sua alma e saibam,
desta forma, que elas estão muito além de qualquer dúvida. É preciso ver Aquele
que é invisível e tomar possa daquilo que ainda não pode ser desfrutado. Não é
apenas crer em quem Deus é, mas também que Ele é galardoador dos que o buscam,
pois essa, de acordo com Paulo, era a fé de Enoque! Deus visto como um ser
vivo, observador, julgador e galardoador
das obras humanas — um Deus de verdade, realmente conosco — nós precisamos
conhecer isso, ou não há como andar com Ele.
Portanto,
quando lemos que Enoque andava com Deus, não resta dúvida de que isso significa
que ele tinha uma comunhão muito familiar
com o Altíssimo. Não conheço uma comunhão mais livre, agradável e cordial
do que aquela resultante de andar sempre com um amigo. Se eu quisesse saber
qual pessoa seria mais íntima de outra, certamente seria aquela com quem ela
andasse todos os dias. Se você dissesse: “De vez em quando vou a casa dele e
nos sentamos para conversar”, não teria tanto peso quanto se dissesse: “Todos
os dias andamos juntos por aí”. Quando andam juntos, os amigos se tornam mais
comunicativos — um conta ao outro os seus problemas e o outro se esforça para
consolá-lo — e, em contrapartida, divide com ele os seus próprios segredos.
Quando as pessoas andam sempre juntas por opção, estejam certos de que há
muitas conversas entre elas nas quais um estranho não pode se intrometer.
Se
eu quisesse conhecer um homem por inteiro, gostaria de andar com ele durante
algum tempo, pois o companheirismo revela partes de uma pessoa que mesmo na
vida familiar podem estar ocultas. O andar contínuo pressupõe e gera um
relacionamento íntimo e grande familiaridade entre os amigos. Mas andará Deus,
de fato, dessa forma com os homens? Sim, Ele andou assim com Enoque, e com
muitos outros do Seu povo desde então. Ele nos conta Seus segredos, os segredos
do Senhor, os quais Ele revela somente a quem O teme. E nós, da mesma forma,
contamos a Ele, em louvor, as nossas alegrias; em oração, as nossas tristezas,
e em confissão, os nossos pecados. O coração se desembaraça de todos os seus
cuidados e os lança no coração dAquele que cuida deles por nós! E o Senhor faz
transbordar a Sua bondade sobre os Seus amados enquanto os faz sentir o Seu
eterno amor por eles. Esta é a beleza e a graça da experiência cristã, seu
lírio e sua rosa, seu cálamo e sua mirra. Se quiserem experimentar a nata da
vida com Deus, ela pode ser encontrada em uma fé concreta e na íntima comunhão
com o Pai celestial. E assim andava Enoque com Deus.
Prosseguindo,
está implícito no termo “andava” que a
comunhão de Enoque com Deus era contínua. Como um antigo teólogo bem
observou, Enoque não deu umas voltinhas com Deus e depois deixou Sua companhia,
ele andou com Deus durante centenas de anos! O texto implica que esse foi o
teor da sua vida ao longo de todos os seus 365 anos. Enoque andou com Deus por
300 anos depois do nascimento de Matusalém e, com certeza, também andava com
Ele antes disso. Mas que caminhada esplêndida! Uma jornada de 300 anos! Uma
pessoa poderia desejar mudar de companhia se andasse com qualquer outra, mas
andar com Deus durante três séculos foi tão bom que o patriarca continuou
andando até ir além do tempo e do espaço — e entrar no paraíso — onde ele
continua marchando na mesma companhia divina! Ele tinha o céu na terra, por
isso, não foi nada surpreendente quando deslizou da terra para o céu com tanta
facilidade.
Ele
não tinha comunhão com Deus de qualquer jeito, mas era leal ao Seu amor
perceptível. Enoque não era inconstante, às vezes subindo ao topo da extrema
religiosidade e depois descendo ao vale pantanoso da indiferença, mas, dia a
dia, ele mantinha um relacionamento calmo, feliz e sempre prazeroso com Deus.
Não havia noites de insônia. O dia, com seus cuidados, não tirava seu sono. Sua
caminhada não era uma corrida, apressada, aos trancos e barrancos, era um andar
firme, regular. Enoque andou com Deus por mais de três séculos, sem parar!
Subentende-se,
também, nessa frase que a vida de Enoque
era progressiva, pois quando uma pessoa anda, seja sozinha ou acompanhada,
ela avança, segue em frente. Enoque andava com Deus. Ao fim de 200 anos ele não
estava mais onde começou. Ele estava na mesma companhia, mas tinha avançado na
direção certa. Ao fim de 300 anos ele sentia mais prazer, compreendia mais,
amava mais, tinha recebido mais e podia dar mais, pois havia progredido em
todos os sentidos. Um homem que anda com Deus, necessariamente, crescerá na Sua
graça e no Seu conhecimento e na semelhança com Cristo. Não se pode pensar numa
caminhada constante com Deus, ano após ano, sem que a pessoa favorecida seja
fortalecida, santificada, instruída e mais capaz de glorificar o Senhor.
Por
isso, entendo que a vida de Enoque foi uma vida de progresso espiritual. Ele ia
de força em força e avançava na graciosa peregrinação. Que Deus nos permita
seguir em frente, nós mesmos. Só mais algumas observações sobre o andar de
Enoque com Deus. No Daily Bible Pleadings de John Kitto (1804-1854, compilador
e ilustrador de histórias bíblicas contemporâneo de Spurgeon), há uma
ilustração extremamente agradável de como deve ser andar com Deus: a figura de
um pai levando o filho pela mão e andando com ele sob a aragem das colinas.
Kitto diz: “Como essa criança anda com você, assim você deve andar com Deus.
Ela o ama nesse momento. O mundo — frio e cruel — ainda não separou o
coraçãozinho dela do seu. O amor dela, nessa hora, é a coisa mais pura e mais
bela que ela sentirá, ou você receberá. Alimente esse amor e, como essa criança
anda ao seu lado com todo coração,
você também andará com Deus com todo
coração”.
É
um prazer para essas crianças andar com o pai. As dificuldades do caminho ou as
intempéries nada são para elas — dar uma volta com o pai já é alegria
suficiente. Há aquele aperto quente, terno e afetuoso da mão e um sorriso
radiante nos olhos quando olham para ele enquanto as leva para cima e para
baixo. Esse andar é também humilde,
pois a criança considera o pai o homem mais importante e mais sábio que já
existiu! Ela o vê como a encarnação de tudo que é forte e inteligente. Tudo
quanto o pai diz ou faz ela admira. Enquanto caminha, ela sente a maior afeição
por ele, e também um grande respeito.
Ela está muito perto do pai, mas ainda é só uma criança, e o considera como um
rei.
Além
disso, esse andar é feito em perfeita
confiança. A criança não tem medo de se perder pelo caminho. Ela confia
implicitamente na orientação do pai. O braço dele a protegerá de todos os
perigos e, por isso, ela não se importa muito — por que deveria? Se é preciso
ter cuidado com a estrada, isso é problema do pai, e a criança, portanto, nem
sonha em se preocupar — por que deveria? Se for necessário passar por algum
lugar difícil, o pai a levantará, ou a ajudará a passar — a criança, no
entanto, está alegre como um passarinho — por que não estaria? E é assim que o
crente deve andar com Deus, descansando na ternura eterna e se regozijando no
amor incontestável! O crente deve ficar despreocupado, tanto em relação ao
presente como em relação ao futuro.
Amados
amigos em Cristo, vocês podem confiar no Pai, Ele suprirá todas as suas
necessidades —
O Pai
cuida de você como se não houvesse
outro homem na terra
ou anjo no céu.
Que caminhada instrutiva tem uma criança com um pai
sábio e comunicativo! Quantos pequenos mistérios são explicados a ela, quanta
coisa ao seu redor é iluminada pela sabedoria do pai! A cada passo, ela se
torna cada vez mais sábia por causa da sua companhia. Felizes são os filhos de
Deus que têm sido ensinados pelo Pai enquanto caminham com Ele! Enoque deve ter
sido um homem de profundo conhecimento e de grande compreensão das coisas
divinas. Ele deve ter mergulhado nas profundezas de Deus muito mais que
qualquer outro homem. Sua vida, também, deve ter sido uma vida santa, pois ele andava com Deus, e Deus
nunca Se desvia do caminho da santidade. Se andamos com Ele, precisamos andar
de acordo com a verdade, a justiça e o amor. O Senhor não faz companhia ao
injusto e rebelde, por isso, sabemos que se Enoque andava com Deus, ele deve
ter sido um homem íntegro e santo.
Além
do mais, a vida de Enoque deve ter sido uma vida feliz. Quem poderia ser infeliz em tal companhia?! Com o próprio
Deus ao nosso lado, o caminho nunca será triste. “Ainda que eu ande pelo vale
da sombra da morte, não temerei mal nenhum, porque tu estás comigo” (Sl.
23:4a). Deixe Deus ser sua companhia e sua estrada será um caminho agradável e
uma via de paz. Não andou Enoque com Deus? Então, sua peregrinação deve ter
sido segura. Que guarda extraordinário é o nosso Deus! Ele é sol e escudo! Ele
dá graça e glória. Aquele que habita no esconderijo do Altíssimo à sombra do
Onipotente descansará. Nada pode prejudicar o homem que anda com o Senhor Deus
à sua direita.
E
ainda, que honra é andar com o
Eterno! Muita gente daria milhões para andar com um rei. Algumas pessoas são
tão fascinadas por autoridades superiores que, se um rei lhes der um sorriso,
ficam totalmente inebriadas de prazer! Qual será, então, a honra de andar com o
Rei dos reis? Que título de nobreza será concedido a quem andar com o bendito e
único Soberano por toda vida? Quem é aquele assim favorecido para ser
companheiro do Rei, e andar a sós com Ele e se tornar Seu amigo íntimo? O
Senhor governa os céus e a terra, e o inferno. Ele é Senhor de todos que
andarem com Ele!
Só
por essa honra, cristãos, devemos ansiar por andar com Deus! Enoque encontrou
segurança, felicidade, santidade, honradez e nem sei mais quantas coisas
excelentes! Mas, com certeza, sua vida foi brilhante — onde encontraremos outra
igual?
2.
Em segundo lugar, vamos considerar QUAIS
CIRCUNSTÂNCIAS ESTAVAM LIGADAS AO ANDAR DE ENOQUE COM DEUS. A primeira
observação é que temos pouquíssimos detalhes
sobre sua vida. Não sabemos muito a seu respeito e esta é sua vantagem.
Feliz é a nação sem história, pois a que tem uma história já foi assolada por guerras, revoluções e derramamento de
sangue. Mas uma nação que é sempre feliz, pacífica e próspera não tem uma
crônica para atrair os amantes de emoções. Feliz foi Enoque por não podermos
escrever uma longa biografia sobre ele! Estas poucas palavras “andou Enoque com
Deus” são suficientes para descrever toda sua carreira até “que já não era,
porque Deus o tomou para si”.
Se
você for ao campo de um agricultor e, quando voltar, disser: “Vi tantas flores
amarelas recobrindo o campo que até parecia um manto dourado. Depois avistei,
aqui e ali, flores brancas como botões prateados dispostos na veste dourada. Vi
também centáureas azuis olhando para o alto com seus olhos adoráveis, fazendo o
campo todo cintilar”; se fosse criança, você o teria achado lindo. Mas o
agricultor balança a cabeça, pois sabe que o campo está em más condições e
cheio de ervas daninhas! Contudo, se ao voltar, você simplesmente disser: “Como
é lindo ver um campo de trigo maduro, e isso é tudo”, então sua descrição,
embora breve, é bastante satisfatória.
Muitos
acontecimentos espantosos, impressionantes e sensacionais que vão tornar uma
biografia interessante podem chamar a atenção, mas não falam da verdadeira
excelência da vida. Nenhuma vida pode superar a do homem que, em silêncio,
continua servindo a Deus no lugar onde a Providência o colocou. Acredito que no
julgamento dos anjos e dos seres puros de espírito, o que será mais admirado na
vida de uma mulher será simplesmente: “ela amava o Senhor e fez o melhor que
pôde por Ele”. E, na vida de um homem, será mais digno de nota de quem for
dito: “ele seguiu inteiramente o Senhor”. A vida de Enoque não teve aventuras.
Mas já não é aventura suficiente andar com Deus? Qual maior ambição pode
almejar uma existência honrosa do que permanecer em comunhão com o Eterno?
Contudo,
alguns dirão: “Bem, mas Enoque devia estar muito bem de vida. Sem dúvida, ele
tinha uma posição bastante vantajosa para ser temente a Deus”. Ora, note que
não era assim, pois, em primeiro lugar, ele
era um homem público. Ele é chamado de “o sétimo depois de Adão”. Ele foi
um homem importante e considerado um
dos pais da sua época. Naquele tempo, um patriarca devia ser alguém notável,
cheio de responsabilidades e de boa reputação. O costume antigo era que o chefe
da família fosse profeta, sacerdote ou rei na sua parentela. E fora da família,
se era um homem de posição e recursos, era conselheiro, magistrado ou
governante. Enoque foi um grande homem em seus dias, um dos mais importantes
daquele período. Portanto, podemos ter certeza de que ele tinha tribulações e
suportava o peso da oposição do grupo de ímpios poderosos que se opunha aos
caminhos da santidade.
Ele
é mencionado em uma lista nobre de homens. Algumas pessoas tolamente pensam:
“Eu andaria com Deus se tivesse uma casinha no campo, se vivesse num vilarejo
pacato, mas, veja, sou um homem público, tenho um cargo de confiança e tenho de
estar com meus colegas. Não vejo como posso andar com Deus”. Ah, meu caro
amigo, mas Enoque andou! Embora ele fosse, sem dúvida alguma, um homem célebre
em sua época e cheio de deveres públicos, ainda assim ele não perdeu o fio da meada
da conversa sacra com o Céu, e continuou firme no curso santo de sua vida
durante séculos. Note ainda que Enoque
foi um homem de família. Enoque andou com Deus e teve filhos e filhas.
Alguns
dizem “Olha, você não pode viver como quer quando tem uma porção de filhos à
sua volta. Não me diga que dá para orar durante horas e ler em sossego as
Escrituras quando se tem uma grande família com filhos pequenos. Você será
perturbado e haverá muitos incidentes domésticos que, com certeza, tentarão
tirá-lo do sério e acabar com sua serenidade. Vá para a floresta e encontre uma
casinha abandonada — lá, com um jarro de água e um pedaço de pão, talvez você consiga andar com Deus — mas
com uma esposa, nem sempre amistosa, e um bando de crianças que não param
quietas, nem de dia nem de noite, como se espera que um homem ande com Deus?” A
esposa, por outro lado, exclama: “Acho que se eu tivesse continuado solteira,
poderia ter andando com Deus. Quando jovem, eu era cheia de devoção. Mas agora,
com um marido, que nem sempre está nos melhores dias, e com filhos, que parecem
ter uma infinidade de necessidades e nunca estão satisfeitos, como é possível
andar com Deus?”
Voltemos novamente para Enoque e acreditemos que isso é possível! “Andou Enoque com Deus; e, depois que gerou a Metusalém, viveu trezentos anos; e teve filhos e filhas.” Veja, portanto, que ele foi um homem público, teve uma família — e ainda assim, andou com Deus por mais de trezentos anos. Não é preciso ser um eremita, ou renunciar ao casamento, para viver perto de Deus. Além disso, Enoque viveu numa época muito perversa. Ele foi proeminente num tempo em que o pecado estava começando a cobrir a terra. Não demorou muito até a terra se corromper e Deus achar melhor varrer toda a população da sua superfície por causa do pecado.
Enoque viveu numa época de escarnecedores e desdenhadores. Você conhece a sua profecia, registrada por Judas. Ele profetizou, dizendo: “Eis que veio o Senhor entre suas santas miríades, para exercer juízo contra todos e para fazer convictos todos os ímpios, acerca de todas as obras ímpias que impiamente praticaram e acerca de todas as palavras insolentes que ímpios pecadores proferiram contra ele.” Ele viveu num tempo em que poucas pessoas adoravam a Deus, e quem o fazia estava sendo atraído pelas palavras lisonjeiras das filhas dos homens. A igreja e o estado estavam propondo união, costumes e prazeres regidos pelo momento e as coisas do mundo estavam na ordem do dia. Ele viveu próximo do final dos tempos primitivos, onde a vida longa dos homens havia produzido grandes pecadores — e grandes pecadores tinham criado grandes provocações contra Deus. Não se queixe, então, da sua época e dos seus vizinhos e de outras coisas, pois em meio a todas elas você ainda pode andar com Deus.
Enoque andou com Deus e, em consequência disso, ele deu testemunho de Deus. “Profetizou Enoque, o sétimo depois de Adão”. Ele não podia ficar calado! O fogo ardia dentro dele e não podia ser contido. Quando testemunhava de Deus, é claro que ele encontrava oposição. Tenho certeza disso pelo contexto de Judas, pois a passagem tem a ver com murmuradores “e descontentes, andando segundo as suas paixões. E cuja boca vive propalando grandes arrogâncias”, e Enoque é apresentado como tendo sido levado a tratar com essas pessoas. Seu sermão mostra que ele foi um homem que permaneceu firme em meio a uma torrente de blasfêmias e coisas reprováveis, liderando a grande controvérsia pela Verdade de Deus contra a vida ímpia e língua licenciosa dos escarnecedores da sua época. Ele diz: “Eis que veio o Senhor entre suas santas miríades, para exercer juízo contra todos e para fazer convictos todos os ímpios, acerca de todas as obras ímpias que impiamente praticaram”.
É claro que eles falavam contra Enoque, rejeitavam seu testemunho, atormentavam seu espírito, e ele lamentava que, com isso, estivessem falando contra Deus. Pois ele diz: “de todas as palavras insolentes que ímpios pecadores proferiram contra Ele”. Ele via a vida ímpia que levavam e testemunhava contra eles. É incrível que o assunto principal de seu sermão tenha sido o Segundo Advento! E é ainda mais digno de nota que os outros dois homens que se poderia escolher por terem vivido tão perto de Deus, a saber, Daniel e João, também tenham falado muito a respeito da vinda do Senhor e do Dia do Julgamento. Não preciso citar as palavras de Daniel, o qual nos fala sobre o julgamento vindouro e sobre o Ancião de Dias que se assentará no Seu trono. E nem preciso repetir o constante testemunho de João sobre a Segunda Vinda do Senhor. Vou mencionar apenas sua exclamação fervorosa: “Vem, Senhor Jesus!”
Vejam, pois, Enoque foi pregador da Palavra de Deus e, por isso, teve de tomar muito mais cuidado que a grande maioria das pessoas. E mesmo assim, com tudo isso e todas as outras coisas juntas, ele conseguiu agradar a Deus até o fim da vida! Falo de um fim que encontrou um interminável estado de alegria — enquanto esteve aqui ele andou em fé, andou de forma agradável a Deus — e, portanto, sua comunhão com o Senhor nunca foi quebrada.
3. Isso nos leva a concluir com um terceiro ponto — QUAL FOI O FIM DA CAMINHADA DE ENOQUE?
Gostaria primeiramente de salientar que ele
terminou seu trabalho muito cedo. Enoque andou com Deus e esse caminhar foi
tão bom, tão seguro, tão progressivo que ele viajou mais rápido e alcançou seu
lar muito mais cedo do que qualquer um de nós que, às vezes, anda com Deus, e
outras, com o mundo! Trezentos e sessenta e cinco anos seria uma vida longa
para nós, mas foi curta para aquela época, quando muitos patriarcas chegaram
quase a mil anos de idade.
Sua
vida, se comparada à existência comum daqueles dias, foi como um período de 30
ou 35 anos das vidas mais curtas — na verdade, a melhor analogia para sua vida
é a de nosso Senhor. Assim como a vida longa dos homens da sua época, a de
Enoque teve aproximadamente a mesma duração que a do Senhor Jesus em comparação
com a nossa. Enoque morreu relativamente jovem, como Verdon, nosso irmão e
presbítero, recém falecido, e não é de admirar. Dizem que “quem é amado pelos
deuses morre jovem”, e tanto Enoque, quanto Verdon foram homens muito amados.
Talvez esses santos tenham terminado sua carreira cedo porque fizeram seu
trabalho com tanta diligência que acabaram logo.
Alguns
trabalhadores, quando têm algum serviço para fazer em casa, levam o dia todo,
ou até uma semana inteira para acabá-lo, e fazem uma confusão sem fim! Não é à
toa que algumas pessoas vivam tanto, pois precisam de muito tempo para fazer
quase nada! Mas este homem fez seu trabalho tão bem e se manteve tão perto de
Deus que sua jornada terminou ao meio-dia e o Senhor lhe disse: “Vem pra casa,
Enoque! Não precisa mais ficar aí fora, vem para o Céu. Você já deu seu
testemunho, já viveu sua vida. Por todas as gerações os homens o considerarão
como modelo, por isso, pode vir pra casa”. Deus nunca mantém o trigo nos campos
mais tempo que o necessário! Quando está maduro, Ele o colhe de uma vez! Quando
Seu povo está pronto para ir para casa, Ele os leva. Não lamente a morte de um
bom homem quando ele ainda é jovem. Pelo contrário, bendiga ao Senhor por ainda
haver colheitas precoces no mundo e por alguns de Seus santos serem
santificados tão rápido!
Mas,
afinal, o que aconteceu com Enoque? Receio ter dito que ele morreu, ou ainda
direi; é muito natural falar sobre a morte de alguém, mas ele, só ele, e
ninguém mais em toda a raça humana entrou na Canaã celestial sem atravessar o
rio da morte! Está escrito a seu respeito: “e já não era”. Quem acredita que a
palavra “morrer” signifique ser aniquilado teria seu ponto de vista ainda mais
confirmado se as palavras do texto “e já não era” fossem aplicadas a todos os que partiram, pois se há uma
expressão que talvez tenha esse significado no seu modo de tradução é essa — é só essa! “E já não era”, no
entanto, não significa que ele foi aniquilado! Nem mesmo o termo mais fraco
‘morrer’ significa qualquer coisa do tipo!
“E
já não era” quer dizer: ele não estava mais aqui
— e isso é tudo. Ele se foi da terra, mas estava lá — lá, para onde Deus o trasladou. Ele estava, ele está com Deus!
E isso sem ter experimentado a morte! Não se ressinta por ele ter evitado a
morte. Foi um benefício, mas não por algum meio tão extraordinário quanto
alguns pensam, pois quem não morre precisa sofrer uma transformação e Enoque
foi transformado. “Nem todos dormiremos”, diz o apóstolo, “mas transformados
seremos todos” (1 Coríntios 15:51). A carne e o sangue de Enoque não podiam
herdar o reino de Deus — rapidamente ele sofreu a transformação que você e eu
sofreremos no dia da ressurreição. E, assim, ele não estava mais aqui, foi
trasladado ou transplantado dos jardins da terra para o Paraíso lá do alto.
Agora,
se há alguém no mundo que nunca morrerá, é aquele que anda com Deus. Se há
alguém a quem a morte será como nada, é o homem que olha para o Segundo Advento
de Cristo e se regozija nele. Se há alguém que, embora passe pelos portões de
ferro da morte, nunca sentirá o terror do inimigo cruel, é o homem cuja vida
aqui embaixo foi de comunhão constante com Deus! Não há outro meio de escapar
do sofrimento da morte a não ser andando com Deus, e então se poderá dizer:
“Onde está, ó morte, a tua vitória? Onde está, ó morte, o teu aguilhão?” (1
Coríntios 15:55). Está escrito de Enoque que “Deus o tomou para si”. Uma expressão extraordinária! Talvez Deus o
tenha feito de forma visível. Não seria de estranhar. Talvez os patriarcas o
tenham visto partir, assim como os apóstolos viram quando o Senhor foi assunto
ao céu.
Seja
como for, houve um arrebatamento especial, algum tipo diferente de acesso desse
eleito ao trono do Altíssimo. “E já não era, porque Deus o tomou para si”. Note
que sentiram sua falta. Isso é algo
que eu não poderia deixar passar. Sentiram
sua falta, pois o apóstolo diz: “não foi achado”. Ora, se um homem não foi
achado, é porque alguém procurou por
ele. Quando Elias subiu ao céu, lembrem-se, cinquenta discípulos dos profetas
saíram à sua procura. Não me causa estranheza o que fizeram — eles não se encontravam
com Elias todos os dias — e quando ele se foi, com corpo e tudo, poderiam muito
bem ir atrás dele! Enoque não foi achado, mas procuraram por ele.
Sente-se
falta de um bom homem. Um verdadeiro filho de Deus como esse na igreja,
trabalhando e servindo ao Mestre, é um entre mil — mas se ele tem andado com
Deus, sua morte é lamentada. Sentiremos falta do querido irmão que acabamos de
sepultar. Seus colegas de conselho sentirão sua falta. Todos quantos foram
convertidos a Deus por seu intermédio sentirão sua falta. Eu, com certeza,
sentirei sua falta. Olho para onde ele costumava se sentar — e espero que quem
ocupe o lugar tenha pelo menos metade do seu valor. Será mais do que posso
esperar. Não queremos viver e morrer para que ninguém se importe se estivemos
aqui na terra ou não. Sentiram a falta de Enoque quando ele se foi e assim será
com quem andar com Deus.
Finalmente,
a partida de Enoque foi um testemunho.
O que o bendito Espírito quis dizer por “e já não era, porque Deus o tomou para
si” senão que existe um estado futuro? Os homens tinham começado a duvidar
disso, mas quando disseram: “onde está Enoque?”, e quem testemunhou sua partida
disse: “Deus o tomou para si”, isso foi, para eles, uma evidência da existência
de um Deus, e também de um outro mundo. E quando perguntaram: “Mas onde está o
corpo?”, há ainda outra lição. Dois homens morreram antes de Enoque, quero
dizer, dois cuja morte está registrada nas Escrituras — Abel foi morto e seu
testemunho foi de que o descendente da serpente odeia o descendente da mulher.
Adão, também, morreu cerca de 50 anos antes da trasladação de Enoque, e seu
testemunho foi de que, mesmo quando demora, o castigo é certo, e “a alma que
pecar, essa morrerá” (Ezequiel 18:4). Então vem Enoque e seu testemunho é de
que o corpo pode ser imortal! Ele não
pôde dar testemunho da ressurreição, pois não morreu — para isso temos o
testemunho em Cristo, o qual é a primícia dentre os mortos. Mas o testemunho de
Enoque deu uma boa indicação disso, pois forneceu provas de que o corpo pode ser imortal e viver num
estado celestial. “E já não era, porque Deus o tomou para si”. Sua partida
também foi um testemunho para a humanidade de que há um galardão para os
justos, pois Deus não se assenta com olhar impassível, ignorando o pecado dos
perversos, ou as virtudes dos santos. Seu testemunho prova que Deus vê aqueles
que andam com Ele e Se agrada deles — e pode lhes dar, mesmo agora, as
recompensas do presente, livrando-os do sofrimento da morte — e certamente Ele
recompensará o Seu povo de uma forma ou de outra.
Por
isso, veja, vivendo e morrendo — não, morrendo não, enganei-me de novo —
vivendo e sendo trasladado — Enoque
foi uma testemunha para sua geração! E oro para que todos nós, vivendo ou
dormindo, sejamos testemunhas de Deus. Ah, se pudéssemos viver como o nosso
querido irmão Verdon, a quem recentemente sepultamos, viveu, cuja alma ardia
por amor a Cristo! Ele tinha verdadeira paixão pelas almas! Mal consigo pensar
em alguém entre nós que tenha feito tanto quanto ele, pois embora tivesse de
granjear o pão de cada dia, ele passava as noites conosco no serviço do Senhor,
ou na pregação do evangelho. Depois, muitas vezes ele saía às ruas cansado,
cuidando dos abatidos, para poder recuperá-los! Com frequência, pela manhã,
saía cansado para o trabalho, a não ser pelo descanso encontrado no serviço de
Cristo.
Às
vezes, com os olhos cheios de alegria, ele encontrava um irmão e dizia: “Cinco
almas para Cristo ontem à noite!”. Em outras, depois de um sermão, lá estava o
grande caçador de almas, levando os interessados escada abaixo para a reunião
de oração. E quando apertava minha mão, ele dizia com seu sotaque suíço, o qual
nunca consegui imitar: “Jesus salvou mais alguns esta noite! Mais almas foram
trazidas a Cristo”. Para ele, viver era ganhar almas! Ele era o membro mais
jovem do nosso conselho, mas os grisalhos o respeitavam. Enquanto chorávamos
sobre seu túmulo, não havia um sequer entre nós que não sentisse ter perdido um
verdadeiro irmão em Cristo e um valente soldado. Que o Senhor levante outros
dentre nós para fazer o mesmo que o Presbítero Gordon fazia!
Que
o Senhor desperte os irmãos e irmãs mais velhos para serem mais ativos e torne
os jovens mais dedicados. Nossas fileiras estão desfalcadas, quem irá preencher
as lacunas? Ficamos mais reduzidos, à medida que o Senhor vai levando um e
outro para o lar dos mais instruídos e corajosos. Mas, pela Sua graça, todos os
dias chegam novos recrutas! Que outros mais possam vir — sim, Senhor, traga-os
pelo Teu Santo Espírito para serem líderes nas fileiras da frente, pois
enquanto a vanguarda se transforma na Igreja Triunfante, que a retaguarda seja
sempre acrescida de novos membros! Trasladados para os céus são alguns, que
outros sejam trasladados das trevas para a maravilhosa luz, por amor de Cristo.
Amém.
Tradução: Mariza Regina
de Souza
Maravilhoso!!
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